Atente-se: "O pargum é um peixe português. Portugal é um país de peixe, como toda a gente sabe. Há anos falou-se muito do cherne. Hoje falo do pargum. O pargum julga ser um pargo, mas não é. É um pargum. O pargum é um peixe muito abundante nas águas nacionais. Tem duas características. A primeira é andar sempre pela direita. Tanto anda pela direita, que acaba sempre às voltas e voltas, em círculos intermináveis, a ver se se reencontra, e ninguém o convence de que há outros sentidos. A segunda é a sua obsessão pela legitimidade. O pargum só aceita o que diz ser legítimo, mesmo que irracional e ridículo. Olha para os pargos e só quer branquinhos, e diz que são "legítimos". Os outros, despreza-os e chama-os de "mulatos". Olha para os outros peixes e pronto, é "monhés", é "pretos", é "ciganada", é um chorrilho de insultos, mesmo que se trate dos líderes eleitos do cardume. Os parguns marcaram uma manifestação para sábado, na qual irão dar à guelra a recusar "um governo ilegítimo". Ontem um grande pargum até falou na televisão e tudo, dizendo que a educação legítima de um pargo é como Deus quer e não de outro modo. O pargum é um peixe que se autoproclama de águas límpidas e pouco profundas. Porém, é na verdade um peixe que vive nas profundezas, onde só vê, respira e se alimenta de lodo e caca, o que lhe transforma irremediavelmente os poucos miolos nisso mesmo. Porque é que o pargum é uma espécie protegida em Portugal? Ninguém sabe nem compreende. Mas é-o, e muito. Pela comunicação social pargum, por comentadores parguns e, até, pelo velho pargum-mor, que se julga um presidente dos pargos, mas não é. É apenas o maior dos parguns. E porque tem o pargum o nome de pargum? Há quem diga que pargum é uma corruptela de pargo combinada com um fenómeno fonético chamado de rotacismo, que transmuta sons de consoantes (comum, por exemplo, na evolução do latim para o português). Neste caso, de v em g. Outros evocam explicações mais populares para explicar o pargum. Entre outras, por ser estúpido como um atum. Eis o pargum. Nada temam, que não está em risco de extinção. Quem nos dera".
(Esta prosa e outros "bacalhaus" pode ser encontrada aqui: http://jugular.blogs.sapo.pt/)