Albardas e Alforges... nunca vi nada assim! Minto... já vi!
Quinta-feira, 6 de Maio de 2004
Alentejo...

Nota Prévia


Mais algumas palavras sobre o papel/função dos autarcas. Ao nível regional, todos os actores são protagonistas do desenvolvimento, na busca de um projecto comum num espaço controlado localmente. O Poder Local tem papel indutor, em aliança com os actores locais (cidadãos). Os agentes económicos devem actuar de forma estratégica na cadeia produtiva que caracteriza o território local, apoiados numa visão que busca a promoção da capacitação e consciencialização para a sustentabilidade regional. Os actores locais são o factor de criação de ideias e construção da identidade, pela presença de capital humano, conhecimento, inovação e responsabilidade compartilhada. Como se sabe, processo é tempo e supõe constante mudança. A dialéctica só existe quando se utiliza esta noção de tempo na busca por compreender o processo solidário de transformação do território. Vivemos um período que é uma crise, pela sobreposição de forças que são convergentes no tempo – agem simultaneamente; e são divergentes na forma e função – partem de diferentes agentes, com acções diferentes; e, diferentes nos impactos por elas gerados. Instalam-se em toda parte e a tudo influenciam. São variáveis que se chocam e incomodam, agindo e reagindo, "o movimento contrário" dos antagonismos. E aqui importa conhecer os processos, a dinâmica dos lugares, através de um modo de pesquisa aberto e dinâmico, onde não há uma afirmação de verdade total. Parece-me que alguns blogs tem trazido contributos muito válidos.


ALENTEJO: um equívoco ou uma região?


A GEOGRAFIA E A HISTÓRIA


Parte IV


No conjunto parece ser possível identificar três pólos distintos de desenvolvimento e de histórica articulação do espaço - excluindo Évora, pela sua posição e função central, não só face à região mas a todo o conjunto do Alentejo - distinguindo-os de uma área periférica, de características distintas. A possibilidade de desenvolvimento simultâneo de núcleos urbanos tão próximos remete, desde logo, para uma realidade que, sendo típica de regiões europeias que desde a Idade Média mantiveram até hoje a sua riqueza, só acha um paralelo alentejano nas terras situadas imediatamente a sul da escarpa da Vidigueira, no Baixo Alentejo.


Significa isto que encontramos condições naturais suficientemente favoráveis para levarem, à multiplicação dos centros urbanos? Parte significativa dessa prosperidade justificar-se-ia historicamente por as terras serem especialmente aptas para o cereal e a oliveira, com repercussões na prosperidade da indústria moageira e dos lagares. Na centúria de novecentos, percorrendo as colinas com vista à elaboração do Guia de Portugal, Raul Proença notara que esta região «é toda ela um olival densíssimo». Daí, talvez, a predilecção dos monarcas medievais por uma vila (Beja) com tais facilidades de abastecimento, e que, a seguir a Évora, se afirma como um dos locais privilegiados de pousada do rei, levando D. Dinis a construir aí um paço.


Ao pão e ao azeite vem juntar-se, em força, o vinho. Sobretudo em Borba que era e é um dos mais significativos centros produtores do Alentejo. Até ao século XIX repartia a posição dominante no sector com a área da Vidigueira, Vila de Frades, Vila Alva, e, tal como esta última área, tinha produtores suficientemente conscientes e organizados para fazerem ouvir o seu protesto junto do poder central, contra a invasão da cultura da vinha, que alastrava no Alentejo na segunda metade do mesmo século e na primeira metade do seguinte (à medida que também o sucesso dos trigos estrangeiros vai tornando menos competitiva a cultura arvense), e que a ameaça privar, face à concorrência de vinhos de inferior qualidade - os de Elvas, por exemplo -, de um predomínio que julgava indiscutível.


Apesar da filoxera, a implantação da vinha não parece ter mudado muito na actualidade: a maior parte das áreas que entretanto se tinham lançado na produção para o mercado não resistiram; os centros históricos de produção de vinho, pelo contrário, mantêm o seu papel tradicional como pólos de outras tantas regiões vinícolas: a do Redondo e, mais a sul, a de Reguengos de Monsaraz. juntas, com o seu prolongamento baixo-alentejano da Vidigueira, estas regiões formam uma meia-lua vinícola que, a par de outras de organização mais antiga (o Douro é a principal) vêm desfrutando de uma certa preponderância no mercado interno.


O liberalismo, a desamortização e, no século XIX mais tardio, a venda dos terrenos baldios, permitiram que aqui e no resto do Alentejo - José Cutileiro estudou o processo para o concelho de Reguengos de Monsaraz - muitos lavradores que cultivavam terras de outrem se pudessem vir a transformar, eles próprios, em senhorios rentísticos. Uma modificação real, e de vulto, só adviria com a segunda metade da presente centúria (1967), no momento em que o plano de construção de barragens no Alentejo permitiu o aparecimento de um perímetro irrigado, grosso modo, que vai do Caia a Santa Clara.


No arranque do regadio do Caia, por exemplo, embora mais de metade da área total irrigada ainda fosse ocupada por um pequeno número de 19 médios e grandes proprietários, com mais de 100 hectares cada, a restante superfície era dividida entre 694 proprietários, entre os quais 480 com menos de um hectare. O tipo de agricultura intensiva praticada - arroz, tomate - provocou ainda, tal como nos vales do Sorraia ou do Sado, um intenso movimento sazonal de mão-de-obra que veio afinal substituir-se às tradicionais migrações de «ratinhos», provenientes da Beira, aquando das ceifas, que sempre haviam sido particularmente intensas na região de, Elvas.


A profundidade das transformações registadas não chega, no entanto, para apagar aquele que parece ser, no Alentejo, o mais permanente vector de ordenamento do território, historicamente situável desde o domínio romano: o predomínio do interior face ao litoral, que é também o das terras do maciço antigo face aos terrenos sedimentares arenosos das bacias do Tejo ou do Sado. No Alto como no Baixo Alentejo. Aqui, tanto como no clima ou no regime de propriedade, está a medida da diferença em relação ao vizinho Algarve ou às regiões situadas a norte.


CONTINUA...



publicado por albardeiro às 01:12
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1 comentário:
De Planície Heróica a 6 de Maio de 2004 às 23:11
Duas notas:
- O Plano de regadio da década de sessenta não esquecia a importância vital que tem o escoamento das produções. Quantos projectos têm falhado por se preocuparem apenas com a produção esquecendo estulticiamente o escoamento condigno e rentável dos produtos?...
- O esquema social e político que vivemos hoje no Alentejo, advem, em grande medida, da venda de baldios a que o liberalismo arrogante e cego sujeitou esta região. Desestruturou-a, desequilibrou-a e deixou-a em chaga. Nas 'Histórias do Alentejo' que tenho vindo a publicar concluir-se-á mais adiante esta evidência...

Um abraço,
Francisco Nunes


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