Vou ter que recorrer, mais uma vez, a um excerto do texto de ROGÉRIO RODRIGUES, no editorial de hoje na Capital, para introduzir alguns conselhos aos garbosos delegados/congressistas que certamente se irão mostrar ao Maioral e dizer ao dito que est~~ao prontos para ocupar os lugares onde agora estão os outros... ou seja, mais do mesmo!
"Estamos a caminhar para novos modelos de polÃtica, para uma outra gastronomia partidária, com o fast food a alimentar a obesidade dos interesses e de uma governação à bolina. José Sócrates tem, a partir deste fim-de-semana, a sua grande oportunidade. Falta saber quem serão as suas companhias. O Governo, nas suas opções e no seu quotidiano, acaba por ser o seu melhor parceiro. Dá-lhe razões e já não precisa de se justificar. Sendo ele o guterrista, o ónus do guterrismo coube a Ferro Rodrigues. E esse ónus já está esgotado. Ferro Rodrigues sai de cena, foi acusado de heranças incómodas, e hoje Sócrates, o delfim do antigo primeiro-ministro, está ungido pelo esquecimento e por oitenta por cento dos votos dos militantes socialistas que querem regressar ao Poder."
Nós pedimos, nós rogamos, nós... CarÃssimos, tenham sempre presente estes mandamentos:
1. Mantenha viva a indignação. Verifique periodicamente se você é mesmo de esquerda. Adopte o critério de Norberto Bobbio: a direita considera a desigualdade social tão natural quanto a diferença entre o dia e a noite. A esquerda encara-a como uma aberração a ser erradicada. Cuidado: você pode estar contaminado pelo vÃrus social-democrata, cujos principais sintomas são usar métodos de direita para obter conquistas de esquerda e, em caso de conflito, desagradar aos pequenos para não ficar mal com os grandes.
2. A cabeça pensa onde os pés pisam. Não dá para ser de esquerda sem "sujar" os sapatos lá onde o povo vive, luta, sofre, alegra-se e celebra as suas crenças e vitórias. Teoria sem prática é fazer o jogo da direita.
3. Não se envergonhe de acreditar no socialismo. O escândalo da Inquisição não fez os cristãos abandonarem os valores e as propostas do Evangelho. Do mesmo modo, o fracasso do guterrismo não deve induzi-lo a descartar o socialismo do horizonte da história humana. O capitalismo, vigente há 200 anos, fracassou para a maioria da população mundial. Hoje, somos 6 biliões de habitantes. Segundo o Banco Mundial, 2,8 biliões sobrevivem com menos de 2 dólares por dia. E 1,2 biliões, com menos de 1 por dia. A globalização da miséria só não é maior graças ao socialismo(!) chinês que, malgrado os seus erros, assegura como pode alimentação, saúde e educação a 1,2 biliões de pessoas.
4. Seja crÃtico sem perder a autocrÃtica. Muitos militantes de esquerda mudam de posição (por vezes dão cambalhotas) quando começam a catar o piolho na cabeça de alfinete. Preteridos do poder, tornam-se amargos e acusam os seus companheiros(as) de erros e vacilações. Como o ditado, vêem o cisco do olho do outro, mas não o camelo no próprio olho. Nem se engajam para melhorar as coisas. Ficam como meros espectadores e juizes e, aos poucos, são cooptados pelo sistema. (A sério: a autocrÃtica não é só admitir os próprios erros, é admitir ser criticado pelos(as) companheiros(as)).
5. Saiba a diferença entre militante e "militonto". "Militonto" é aquele que se gaba de estar em tudo, participar de todos os eventos e movimentos, actuar em todas as frentes. A sua linguagem é repleta de chavões e os efeitos da sua acção são superficiais. Portanto seja um militante: já agora, o militante será o que aprofunda os seus vÃnculos com o povo, estuda, reflecte, medita; qualifica-se numa determinada forma e área de actuação ou actividade, valoriza os vÃnculos orgânicos e os projectos comunitários.
6. Seja rigoroso na ética da militância. A esquerda age por princÃpios. A direita, por interesses. Um militante de esquerda pode perder tudo - a liberdade, o emprego, a vida. Menos a moral. Ao desmoralizar-se, desmoraliza a causa que defende e que encarna. Presta um inestimável serviço à direita. Desconfie, não se esqueça que há pelegos disfarçados de militantes de esquerda. É o sujeito que se engaja visando, em primeiro lugar, a sua ascensão ao poder. Em nome de uma causa colectiva, busca primeiro o seu interesse pessoal – não queira ser um desses...! ATENÇÃO: o verdadeiro militante -como Jesus, Gandhi, Che Guevara- é um servidor, disposto a dar a própria vida para que outros tenham vida. Não se sente humilhado por não estar no poder, ou orgulhoso ao estar. Ele não se confunde com a função que ocupa.
7. Alimente-se na tradição da esquerda. É preciso oração para cultivar a fé, carinho para nutrir o amor do casal, "voltar à s fontes" para manter acesa a mÃstica da militância – se tiver dúvidas pergunte a Guterres e ao padre MelÃcias. No entanto, conheça a história da esquerda, leia (auto)biografias, como o "Diário do Che na BolÃvia", e romances como "A Mãe", de Gorki, ou "As Vinhas de Ira", de Steinbeck.
8. Prefira o risco de errar com os pobres a ter a pretensão de acertar sem eles. Conviver com os pobres não é fácil. Primeiro, há a tendência de idealizá-los. Depois, descobre-se que entre eles há os mesmos vÃcios encontrados nas demais classes sociais. Mas nunca se esqueça que Eles não são melhores nem piores que os demais seres humanos (qual elites, isso são coisas de renegados, tipo JPP). Todavia, a diferença é que são pobres, ou seja, pessoas privadas injusta e involuntariamente dos bens essenciais à vida digna. Por isso, vá lá não custa assim tanto, estamos ao lado deles. Por uma questão de justiça. Lembre-se (mesmo que passe a andar com motorista), um militante de esquerda jamais negoceia os direitos dos pobres e sabe aprender com eles.
9. Defenda sempre o oprimido, ainda que aparentemente ele não tenha razão. Compreenda que são tantos os sofrimentos dos pobres do mundo que não se pode esperar deles atitudes que nem sempre aparecem na vida daqueles que tiveram uma educação refinada. O importante é que tenha presente que em todos os sectores da sociedade há corruptos e bandidos (veja lá não se passe). A diferença é que, na elite, a corrupção se faz com a protecção da lei e os bandidos são defendidos por mecanismos económicos sofisticados, que permitem que um especulador leve uma nação inteira à penúria.
10. Faça da militância um antÃdoto contra a alienação. Agora a sério porque provavelmente também me incluo e não quero fugir com o rabo á seringa: falamos como militantes e vivemos como burgueses, acomodados ou na cómoda posição de juizes de quem luta.
Tenha um bom congresso... desfrute!