Conversando!
Talvez uma das melhores relações que mantemos na nossa vida pessoal seja com os amigos, aqueles que realmente escolhemos, admiramos e com quem, por uma razão ou outra, nos identificamos, nos divertimos trocamos experiências e nos encontramos em várias dimensões.
O encontro com os amigos aos de fim de semana, por vezes tem a virtude de elevar as conversas a categorias que são mais do que as intimidades próprias da amizade e assumem uma concepção com dimensão política/social/cultural, ou seja e complicando a coisa, - esta dimensão política da amizade é também a preocupação com a condição humana na Polis em que o mundo comum é objecto de diálogo. Até prova em contrário, parece-nos a nós, estamos também a humanizar o mundo e aprendemos a ser humanos.
Vem este paleio todo a propósito de uma conversa entre amigos sobre as injustiças, as gritantes desigualdades, a dimensão social da globalização, as políticas neo-liberais e a sua indiferença pelo social e, sobretudo, a dimensão histórica do fosso entre pobres e ricos. Dessa conversa ficaram alguns dados incompletos e porque é uma conversa obviamente que tinha que ser assim. Para colmatar a lacuna (agora mais documentado) ocorreu-me publicar um post sobre o assunto. Vejamos uma pequena parte do que nos atormentava:
O balanço e levantamento realizado pelo Institute for Policy Studies, Top 200: The Rise of Corporate Global Power 2000, informava que, das maiores cem economias do mundo, 52 eram corporações, apenas 48 diziam respeito a países. A pesquisa mostrava o pódio das maiores: A Mitsubishi era a 22ª maior economia do mundo. A General Motors era a 26ª. A Ford era a 31ª. Todas eram economias maiores do que a da Dinamarca, Tailândia, Turquia, África do Sul, Arábia Saudita, Noruega, Finlândia, Malásia, Chile e Nova Zelândia. O mesmo estudo contabilizava que em 1999 o valor das vendas das corporações General Motors, Wal-Mart, Exxon Mobil, Ford Motor e Daimler-Chrysler, em separado, foi maior do que o PIB de 182 países. O valor das vendas das duzentas maiores corporações cresciam mais rápido do que a economia global. No entanto, dizia a pesquisa, que essas duzentas maiores corporações do mundo, responsáveis por quase 30 por cento da actividade da economia global, empregavam menos de 1 por cento da força de trabalho do mundo. Enquanto o lucro delas cresceu 362,4 por cento entre 1983 e 1999, o número de empregos cresceu apenas 14,4 por cento. Essas companhias, ao comprarem competidores, eliminavam empregos duplicados, encerrando empresas competitivas e extinguindo postos de trabalho (veja-se o caso da Bombardier). As mil companhias mais ricas do mundo controlavam mais de 80 por cento da produção industrial do planeta, segundo uma pesquisa do conceituado jornalista internacional americano Robert Kaplan (The Atlantic Monthly, em 1997).
Um estudo da Rural Advancement Foundation International, The ETC Century, 2001, encontrou o mesmo tipo de concentração de poder e lucro na indústria farmacêutica : Há vinte anos atrás, as vinte maiores companhias farmacêuticas eram responsáveis por 5 por cento do comércio de drogas sob prescrição, no mundo. Hoje, as dez maiores controlam 40 por cento do mercado. O mesmo estudo mostra o que aconteceu na indústria de equipamentos agrícolas. Há vinte anos atrás, 65 companhias de químicos agrícolas competiam no mercado mundial. Hoje, nove companhias detêm aproximadamente 90 por cento das vendas de pesticidas, 90 por cento das novas tecnologias e patentes de produtos estão nas mãos de corporações com dimensão global de mercado.
Mais: sobre toda essa riqueza não precisam de pagar qualquer imposto. Nos Estados Unidos, a porcentagem de impostos pagos por corporações sobre o rendimento caiu significativamente de 25 por cento pagos nos anos 60 para 9 por cento pagos nos dias actuais veja-se: Reuven Avi Yonah, The American Prospect, 2000. O Relatório da ONU, de 1999 (os mais recentes não tive acesso 2001 e 2003), referia que a diferença entre o rendimento de um quinto da população do mundo vivendo nos países mais ricos para o um quinto vivendo nos países mais pobres aumentou para o dobro de 1960 para 1990. Em 1998, a relação aumentou de novo. O mesmo documento informava que a riqueza das duzentas pessoas mais ricas do mundo tinha aumentado de 40 biliões para mais de 1 trilião de dólares de 1994 para 1998.
Mais: Os activos das três pessoas mais ricas do mundo eram maiores do que o PIB dos 48 países mais pobres juntos. O documento dizia ainda que o número de milionários no mundo tinha aumentado em 25 por cento nos últimos dois anos. A soma da riqueza dos 475 indivíduos mais ricos era maior do que o rendimento de metade da população do mundo. Um quinto (mais rico) das pessoas do mundo consome 86 por cento de todos os bens e serviços, enquanto o quinto mais pobre consome apenas 1 por cento. A expectativa de vida nos países mais pobres era/é de 25 anos menor do que a dos países industrializados, afirmava o ano passado Kevin Watkins, consultor sénior de política da Oxfam, uma confederação de vinte ONGs trabalhando em oitenta países em busca de soluções para a pobreza. Em Abril de 2003, o G-77, formado pelos 77 países mais pobres do mundo, editava uma declaração condenando o FMI e o Banco Mundial e apoiando os protestos dos movimentos antiglobalização. Mas nós sabemos que o sistema discriminatório da globalização constrói os mundos completamente diferentes do Sul e do Norte, alinhados ou não alinhados com o império.
Precisamos de novos bárbaros...