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albardeiro

Albardas e Alforges... nunca vi nada assim! Minto... já vi!

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Albardas e Alforges... nunca vi nada assim! Minto... já vi!

O SENTIDO DA POLÍTICA

albardeiro, 25.01.09

A recente discussão e “chumbo”, na Assembleia da República, do projecto-lei apresentado pelo CDS-PP, que previa a suspensão do actual modelo de avaliação dos professores e a implementação de mecanismos para a resolução do problema, permitindo a pacificação do conflito existente entre o Governo PS-Sócrates e os profissionais da educação, é um exemplo sintomático do sentido da política do actual Executivo. O único comentário que o assunto mereceu a José Sócrates foi que “Vejo muita gente do PS a achar que não devemos fazer alianças com o CDS, mas vi agora alguns elementos do PS a votar com o CDS, e não gostei” (Público, 24/01/09). De que estaria ele a falar? Não certamente da educação e dos problemas do ensino público em Portugal. Mas não era precisamente isso que estava em causa? O que é que, afinal, move Sócrates e o seu partido? Reduzindo a questão a uma mera luta político-partidária, o PS demonstrou um absoluto desprezo pela contestação de toda uma classe profissional e uma completa insensibilidade pelos problemas do sector. Mais. Fazendo valer um poder absoluto que considera ter-lhe sido atribuído nas últimas eleições, reduziu a acção política ao pressuposto totalitário da omnisciência e infalibilidade, tendo como único objectivo a imposição, por todos os meios possíveis, dos seus diktat.


Desprezando sobranceiramente a clássica definição lincolniana da democracia como o “poder do povo, pelo povo e para o povo”, confunde-se maioria absoluta com absolutismo, com o “quero, posso e mando” mais desbragado, com o autismo mais obsessivo e com a pretensão mais absurda de ser dono da verdade, mesmo quando a quase totalidade dos representantes do sector da educação, provenientes de todas as áreas e orientações partidárias, incluindo mesmo destacados dirigentes e deputados socialistas, rejeitam a política seguida. A acção governativa deixa, assim, de ter como objectivo o “bem comum” no governo da polis, através do debate e da procura partilhada de soluções – o “agir comunicacional” de que falava Habermas –, para passar a ser um mero exercício discricionário de poder, autoritário na forma e totalitário na substância. Governar contra as pessoas não é próprio da democracia, mas sim das “engenharias sociais” características das piores ditaduras. Ora, é bom que o PS tenha consciência que ninguém votou nisto e ninguém plebiscitou o fim da democracia.


Ter maioria eleitoral absoluta significa, pelo contrário, ter maior empenho na procura de soluções bem fundamentadas, tendo a preocupação de ouvir o máximo de intervenientes possíveis, de obter toda a informação disponível, de analisar as propostas existentes, de discutir soluções, de procurar compromissos e entendimentos, já que se tem a responsabilidade exclusiva pela decisão governativa. Nunca pode significar auto-suficiência, nem ensimesmamento. Não é ter uma posição completamente autista, recusando todo e qualquer diálogo com os interessados e antagonizando sistematicamente as suas organizações representativas. Em democracia, a maioria absoluta responsabiliza pela decisão e, por isso, obriga ao aconselhamento e ao debate.


Por outro lado, maioria absoluta não significa um “cheque em branco” passado pelo eleitorado para, em todo o tempo e sobre qualquer assunto, o Governo poder fazer o que bem lhe apetece. Esta é uma visão francamente redutora do que é a democracia. Especialmente quando, como é o caso da Educação, há uma unanimidade inédita na reacção às medidas tomadas e um alerta geral sobre a degradação das condições de ensino nas escolas públicas. Até para se evitarem erros grosseiros e situações politicamente embaraçosas, de que é exemplo paradigmático a obstinação do ministro Mário Lino a propósito da localização do novo aeroporto de Lisboa e da sua tão famosa quanto caricata afirmação “Alcochete, jamais!”. Lembram-se?


Quanto às questões da Educação para o Governo PS-Sócrates, estamos conversados. Como diz a expressão popular, “não sabe, não quer saber e tem raiva a quem saiba”. Mas esta postura totalitária, por mais absurda que pareça, tem um significado muito mais profundo e preocupante. É que, como afirmou o sociólogo Boaventura de Sousa Santos, “O fascismo não é uma ameaça. O fascismo está entre nós.” (Reinventar a Democracia, 1998). Com efeito, o “fascismo societal” de que fala, revela-se no sistemático predomínio dos factores de instabilidade e exclusão social, em vez da preocupação com a inclusão que o contrato social da modernidade pressupunha. Para este autor, “O fascismo societal convive tanto mais facilmente com a democracia política quanto esta perde a capacidade para redistribuir recursos e oportunidades. Assim debilitada, a democracia passa a ser uma democracia de baixa intensidade.” Ora, os sinais crescentes desta realidade, implementados pela acção premeditada do actual governo, denunciam intenções e procedimentos de extrema perigosidade para a nossa vida colectiva.


Não é por acaso que também José Gil intitula uma sua crónica na revista Visão (2/10/08), de “A domesticação da sociedade”. Esta espécie de “servidão voluntária”, de que falava La Boétie, resulta precisamente do mecanismo de perversão política usado pelo Governo PS-Sócrates para domar os espíritos, baseando-se na estratégia reiterada de “ausência total de resposta a todo o tipo de protestos. (…) Ausentando-se da contenda, tornando-se ausente – acrescenta Gil – o poder torna a realidade ausente e pendura o adversário num limbo irreal. Deixando intactos os meios da contestação, mas fazendo desaparecer o seu alvo, desinscreve-os do real. É uma técnica de não-inscrição.” Perante a absoluta inutilidade da contestação e o impacto insuportável do nada, inicia-se o processo de interiorização da obediência. Mais tarde sobrevirá o “amor à servidão” – ou, nas palavras premonitórias de António Vitorino no dia da tomada de posse do actual Governo, “habituem-se!”. Para o filósofo, estas “São técnicas terríveis de dominação, de castração e de esmagamento, e de fabricação de subjectividades obedientes.”, no que é designado por “desactivação da acção”, isto é, “a não-inscrição elevada ao estatuto sofisticado de uma técnica política, à maneira de certos processos psicóticos.” O autor conclui que “o português voltou à inércia e à passividade face às transformações inelutáveis que abalaram a sua existência como um destino.” Parece estarmos perante uma espécie de Fado, Fátima e Futebol da pós-modernidade neo-liberal, naquilo que, numa conhecida obra, José Gil já tinha caracterizado de forma certeira como “o medo de existir”. O que é particularmente significativo e, simultaneamente assustador, é que José Gil dê como exemplo emblemático deste processo, precisamente o dos professores. Terá razão?


Hugo Fernandez

A LUTA

albardeiro, 04.01.09

No artigo “A crise e a política”, publicado no jornal Público (29/12/08), o politólogo Pedro Magalhães considera que, pelo menos a curto prazo, as consequências políticas da crise internacional são “boas notícias para muitos governos europeus que estavam em acentuada crise de popularidade e que recebem assim um balão de oxigénio.” Com efeito, para este autor, a situação que actualmente se vive, “vem neutralizar os mecanismos de responsabilização dos governos pelo seu desempenho, limitar o espaço de contestação política e diminuir as possibilidades de alternância.” Cita, para o efeito, as recentes sondagens feitas em países como a Inglaterra ou a França, mas também em Portugal. Acredita-se que a popularidade do governo Sócrates tem não só resistido às dificuldades presentes, como aumentado mesmo a sua cotação.


A ser assim, as várias classes profissionais humilhadas e ostracizadas pelo executivo socialista, as centenas de milhar de desempregados existentes, os inúmeros precarizados e sujeitos a vínculos laborais próprios do século XIX, as populações que um pouco por todo o país têm visto desaparecer as instituições locais de educação, saúde, correios, segurança social, etc, a generalidade da população que tem visto a carga fiscal aumentar desmesuradamente e o investimento público e os serviços prestados pelo Estado atingirem um ponto próximo da negligência, ou estão satisfeitas com o seu destino ou, pelo menos, não encontram outra alternativa do que premiar quem os pôs nesta situação. Todos estes portugueses que viram a sua qualidade de vida ser profundamente afectada pelos ditames do tiranete Sócrates, que foram vítimas da lógica neoliberal da mercadorização de tudo e de todos, que viram os seus rendimentos diminuírem e as suas poupanças serem esbulhadas sem pudor, que viram aumentar de forma escandalosa o fosso entre ricos e pobres, que viram o nosso país atingir índices de desenvolvimento que o situam na cauda da Europa irão esquecer, relevar, louvar. Será?


Não se duvida da competência e agressividade das agências de propaganda deste Governo. Não se duvida da eficácia da mistificação política, reiterada diariamente. Não se duvida do profundo desprezo e agressividade com que são tratados todos aqueles que se atrevem a contestar as orientações governativas. As mais elementares regras do debate político e da convivência democrática têm sido implacavelmente espezinhadas. A lógica da maioria absoluta mostra-se implacável. “Quem não está connosco está contra nós!”, disseram alguns, noutro contexto totalitário.


Não nos esqueçamos, no entanto, que os efeitos da crise são bem reais e vão ser sentidos fortemente pela generalidade da população. Não se tratam aqui de jogos políticos, nem de aritméticas eleitorais. É mais do que isso; trata-se da sobrevivência. É, assim, algo que é difícil esquecer e que diz respeito a cada um de nós. A denúncia da opressiva e gravosa actuação política do governo PS-Sócrates e a concomitante atribuição das responsabilidades a quem as tem é, em todo o caso, a principal missão da esquerda.


Hugo Fernandez