Albardas e Alforges... nunca vi nada assim! Minto... já vi!
Segunda-feira, 29 de Março de 2004
BASTA! Também digo.

Com um ligeiro atraso publica-se (hoje) o texto que o meu amigo Hugo Fernandez me enviou. Na mesma sintonia, o albardeiro agradece.


BASTA!


Todo o terrorismo, isto é, a morte indiscriminada de pessoas inocentes, é obviamente inaceitável. Nunca actos dessa natureza se podem justificar, sejam quais forem as razões invocadas. Ninguém de bom senso tem, portanto, dúvidas quanto a um decidido combate a este problema. No entanto, o terrorismo não é inexplicável. Trata-se, de facto, da manifestação final e dramática de um longo e complexo processo degenerativo da própria realidade, um sintoma agudo de uma doença crónica. E é na avaliação deste fenómeno e no tipo de actuação a empreender que as divergências são notórias e têm que ser legitimamente esgrimidas. Este fenómeno pode ter as suas raízes num desvio de personalidade e em comportamentos individuais, como os que assistimos no caso dos psicopatas perigosos e dos serial killers. Mas o terrorismo pode ser sobretudo uma doença social, que os fanatismos e fundamentalismos ajudam a alimentar. Esta segunda situação, bem mais grave do que a primeira, merece-nos muito mais cuidado e reflexão. Enquanto no primeiro caso, os terroristas agem isoladamente ou com escassos cúmplices exigindo, após a detenção, sobretudo um adequado tratamento médico, no segundo caso, o fenómeno é muito mais complexo e abrangente. É que os terroristas não agem sozinhos, nem são elementos isolados. Há um meio social mais ou menos extenso onde aqueles são recrutados e uma rede que os sustenta e apoia. Ora, são precisamente as causas da disfuncionalidade das vivências das populações que constituem essa rede que, a nosso ver, têm que ser investigadas e, na medida do possível, combatidas. É essa disfuncionalidade que advém do agravamento das situações e do arrastamento dos conflitos, muitas vezes ao longo de décadas, é o ódio latente ou declarado que inevitavelmente produz, com o consequente radicalizar de posições, que tem que constituir a principal preocupação no domínio da prevenção deste terrível flagelo. Muito para além, portanto, da simples acção policial, ainda que esta seja legítima e constitua um instrumento imprescindível para garantir a segurança dos cidadãos. Assim, esse conhecimento e essa actuação terão que ser eminentemente políticas. E é a este nível, o da discussão dos diversos modelos de organização da nossa vida colectiva e do relacionamento entre as sociedades, que as questões verdadeiramente se têm que colocar. Até porque as consequências da manutenção do statu quo meramente repressivo podem ser devastadoras. De facto, uma atitude preventiva como aquela que defendemos é tanto mais urgente quanto se verifica, nos nossos dias e por todo o mundo, um acréscimo acentuado do fenómeno terrorista, apesar do – ou por causa do! – concomitante aumento dos meios repressivos. Este acréscimo de perigosidade deriva precisamente do conjunto de problemas acumulados e não resolvidos. É evidente que nunca os terroristas podem ser considerados, de qualquer forma que seja, justiceiros. Mas na origem dos conflitos que os produziram, encontraremos, certamente, situações de profunda injustiça. Para que se eliminem aqueles há que detectar e procurar resolver estas iníquidades. A realidade ensina-nos que, a não haver esta prevenção, perpetua-se o terrorismo. Este conhecimento, que nunca pode querer dizer compreensão, se por isso entendermos qualquer forma que seja de aproximação ou mesmo de empatia com os terroristas, pode sim significar mais informação e traduzir-se numa actuação mais justa e eficaz. E se, como diz Augusto Santos Silva, “O combate ao terror é, pois, uma condição de sobrevivência das democracias”, este combate terá forçosamente que passar pela detecção e tentativa de resolução das situações que estão na sua origem. Como vimos, a deriva securitária cega , longe de resolver o fenómeno do terrorismo, tende a perpetuá-lo. Não chegam medidas repressivas e discursos inflamados. À repressão tem que se somar a prevenção, para que se elimine o sintoma porque se curou, de facto, a doença. É preciso decididamente encarar os problemas e conflitos que produzem esta tragédia. A não ser assim, não só a violência continuará, como o extremar de posições e o progressivo condicionamento e violação dos direitos humanos que, mais cedo ou mais tarde, afectará a generalidade dos cidadãos, inviabilizará qualquer projecto de vivência democrática. E esta situação constituirá, ela sim, a vitória dos terroristas. Nunca a injustiça pode ser resposta para as injustiças. Porque as democracias não podem sucumbir perante a ameaça terrorista, é fundamental que mantenham a sua matriz constituinte essencial: a garantia, em todas as situações, de uma plena cidadania, da defesa intransigente dos direitos humanos e dos princípios da legalidade e do direito internacional. Basta de hipocrisias ou de falsos moralismos. O assunto é demasiado sério para que não se encarem todas as alternativas possíveis para a resolução do problema. É antes de mais em homenagem às vítimas do terrorismo, em qualquer parte do mundo onde se encontrem, que temos que buscar verdadeiras soluções. É altura de dizer: Basta!



publicado por albardeiro às 23:45
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Quarta-feira, 24 de Março de 2004
(...) Chega!

Domingo, Março 21, 2004


OS MÉDIA REFLECTEM TAMBÉM A CRISE DO IMPÉRIO


Mais uma vez (na verdade não há nada a fazer!... é mais forte...), depois de uma semana de ressaca mediática (independentemente da geografia política/ideológica) sobre os acontecimentos trágicos/cobardes/hediondos/assassinos de Madrid, sobre a mentira do PP (do asno) do Aznar, sobre a vitória eleitoral do PSOE (e de uma vez por todas, foi uma vitória da mudança e não do medo; quem não quiser perceber isso, está tudo dito...!), depois de um ano sobre a invasão e ocupação de um país à revelia da ONU (as armas de destruição massiva, provavelmente deve ser o petróleo que lá existe!), depois de ler José Arbex Jr, depois de ler, ver e ouvir os mais variados comentários (sobretudo os de alguns cujas manchas de sangue, por mais ¿detergentes¿ que usem, dificilmente...), digo, não resisto a algumas palavras sobre a acção da comunicação social e, simultaneamente, abordar um pouco ao de leve o comportamento dos comentadores oficiais e da promiscuidade de alguns responsáveis da comunicação social com o poder (à boa maneira do liberalismo oitocentista, nunca os interesses económicos, em detrimento dos sociais, estiveram tão mancomunados com o político). Este ¿POST¿ é um tributo... CAROS AMIGOS.


Falar do comportamento dos MÉDIA, qualquer análise minimamente crítica, mesmo que rápida, terá de ter em conta a grande diferença entre as coberturas dos ataques estadunidenses praticados em janeiro/fevereiro de 1991 e aqueles que estão em curso, desde Março de 2003. Em 1991, simplesmente não apareceu a população civil iraquiana. A televisão mostrou uma guerra sem sangue, graças às armas ¿cirúrgicas¿ criadas pelos Estados Unidos, capazes de acertar precisamente no alvo, sem causar sofrimentos inúteis. Tudo se passou, então, como se no Iraque não houvesse seres humanos. Agora não. Soubemos/sabemos, pelo menos, que crianças iraquianas foram/estão a ser cruelmente assassinadas; que os ataques causaram grande destruição de sítios arqueológicos; que as bombas atingem civis e que não existem armas que sejam assim tão ¿cirúrgicas¿ (provavelmente depende do ponto de vista!). Mais: todos sabem que Bush filho não atacou o Iraque por motivos humanitários, mas por petróleo (em 1991, Bush pai teve um sucesso bem maior, ao vender a versão de que atacava Bagdad para libertar o Kuwait e salvar o mundo do novo Hitler que surgiu no Médio Oriente ); até prova em contrário, sabe-se que Saddam Hussein não tinha armas de destruição em massa ¿ facto atestado pelos enviados da ONU, e amplamente divulgado pelos meios de comunicação. Sabe-se também que Bush despreza solenemente a Organização das Nações Unidas, os tratados internacionais, os mais elementares princípios humanitários. Em 1991, nada disso estava muito claro. Não que fosse exactamente um segredo. Não era. Mas também não era um facto tão claramente estabelecido.Manipulação dificultada. Claro que isso não tem significado que a cobertura que foi feita (e até a actual), fosse a mais correcta, transparente e democrática (e não se desculpem com o argumento de que foi a possível). Não foi, a começar pelo facto de que se vendeu/vende a ideia de que houve uma guerra entre os Estados Unidos e o Iraque, quando não houve/há guerra alguma, pois as forças em combate não tinham qualquer proporção ou simetria. A cobertura continua a ser parcial e ¿patriótica¿: os correspondentes continuam a falar na libertação do Iraque (versão da rede FOX, CNN, ABC), mediante a derrota da ditadura de Saddam, providencialmente deixando de mencionar que Bush não passa de um fraudador de urnas envolvido até ao pescoço nos escândalos de corrupção que abalaram a economia do seu país, em 2001, 2002 e 2003. E que o seu governo promoveu/promove (o Aznar foi um bom seguidor) uma monumental campanha de perseguição àqueles que ousam criticar. Ainda assim, a capacidade de manipulação das notícias pela comunicação social tem sido, sem dúvida, muito menor e mais limitada do que em 1991. Como explicar a diferença? Simples: ao longo dos últimos dez anos, houve uma rearticulação profunda e monumental dos movimentos sociais e das organizações de trabalhadores, em todo o mundo. Essa rearticulação, que permitiu a realização de três sessões do Fórum Social Mundial, e que foi por ele fortalecida, tem levado milhões de pessoas às ruas, desde 15 de fevereiro de 2003 até ontem 20 de Março de 2004, nas maiores manifestações contra o modo actual do exercício do poder, pelo menos desde os anos 60 (quando a opinião pública mundial derrotou o ¿autismo¿ dos Estados Unidos, na Guerra do Vietname). Em 1991, o mundo, impotente e sem iniciativa, ainda engolia o pó levantado pelos escombros do Muro de Berlim. Consenso? Onde? Bastou uma década para o vitorioso neoliberalismo mostrar a sua falácia quando se trata de oferecer respostas aos problemas básicos levantados pela humanidade; a sua falência moral, como sistema que estimula e multiplica grandiosos esquemas de corrupção; a sua absoluta crueldade, por condenar 11 milhões de crianças à morte por fome, a cada ano (ou 60 milhões de seres humanos, se também contabilizados os adultos, isto é, um número equivalente ao total de mortos na Segunda Guerra). Em dez anos, o fim da história propagado por Francis Fukuyama ¿ um espertalhão funcionário do governo, vendido pelos média como se fosse filósofo ¿ foi transformado, no máximo, na agonia do império estadunidense. É disso, finalmente, que se trata. O império agoniza. Verga sob o peso do seu próprio poderio bélico e das suas contradições internas (e será certamente pior a sua implosão do que tem sido a sua explosão) . A distância entre o império no seu auge e a sua posição no mundo contemporâneo pode ser medida pela mera comparação entre Franklin Delano Roosevelt ¿ arquitecto do New Deal e da versão estadunidense do Estado de bem-estar social ¿ e o débil mental fundamentalista que agora ocupa a Casa Branca. Não, ninguém está a dizer aqui que Roosevelt era um ¿puro¿ ou um líder humanista; mas não há como compará-lo ao macaco precariamente amestrado que agora governa os EUA. Mesmo Bill (Oral) Clinton poderia ser considerado um estadista, ao lado de (Adolf) Bush. Os sinais da decadência multiplicam-se por todos os lados: as empresas estadunidenses perdem competitividade para as europeias e japonesas; a agricultura só sobrevive à custa dos maiores subsídios públicos do planeta; a economia depende, cada vez mais, de um Estado superproteccionista (mas impõem o contrário aos outros). O quadro foi ainda agravado, para os Estados Unidos, com a criação, introdução e sucesso do euro na economia internacional, tirando ao dólar a sua condição de moeda universal e meio de parasitar as riquezas do planeta. Os Estados Unidos queriam mais dinheiro? Fabricavam-se dólares, e o mundo que pagasse a conta. Mau grado as vicissitudes (até alguns dos seus criadores se deixaram enredar na tentativa para o seu insucesso ¿ vejam-se os alinhamentos que tiveram a Espanha, Itália e Portugal com a panaceia estadunidense), o euro criou uma alternativa ao dólar e começou a colocar um fim na orgia financeira. O conflito entre as potências do império, verificado durante os preparativos do ataque ao Iraque ¿ notoriamente, França, Alemanha e, em plano secundário, a Rússia, de um lado; Estados Unidos e os Estados vassalos, Grã-Bretanha e, secundariamente, Espanha e Portugal, do outro ¿, reflectiu a nova realidade internacional construída pelo euro. Em 1991, não houve nem sequer a remota ideia de um conflito. Os Estados Unidos mandaram, a OTAN e o G-7 obedeceram. A União Soviética tinha acabado de desaparecer, e a Rússia nada tinha a declarar.A decadência tem sido tão acelerada, que em poucos meses foi esvaziado o consenso em torno de Bush, artificialmente criado após os atentados de 11 de setembro de 2001. Agora, apesar das perseguições policiais, do clima de caça às bruxas, da histeria patriótica que funciona como uma espécie de cimento psicossocial responsável pela frágil coesão da classe média puritana dos Estados Unidos, apesar de tudo isso, a oposição toma de novo as ruas e existem alternativas. Intelectuais, estudantes, trabalhadores e artistas consagrados denunciam o debilóide texano e desafiam o sistema. Barões em apuros! Os barões da comunicação social captaram essa nova realidade mundial. Eles dependem da credibilidade dos seus leitores e telespectadores. Sabem que não podem mentir sempre, impunemente. O monumental fiasco representado pela tentativa de manipulação e ocultação da verdade dos factos, por parte do governo espanhol e de alguns comentadores nos órgãos de informação, no cobarde atentado de Madrid, provou a escandalosa farsa mediática ¿, deixou as suas marcas e lições. Da mesma forma, os ¿barões¿ (incluindo sobretudo os seus porta-vozes ¿ os denominados comentadores) dos média foram finalmente obrigados a admitir que há seres humanos no Iraque, e que as armas estadunidenses não eram assim tão cirúrgicas. Ainda é pouco, mas esse pouco pode ser suficiente para estimular novas e maiores demonstrações. Tampouco a cobertura da Guerra do Vietname, nos anos 60, foi um show de democracia, como muitos querem acreditar. Muito longe disso. Os grandes jornais tentaram, até ao fim, manter o patriotismo em alta, até serem obrigados a engolir os factos. Bastou o mínimo de informação correcta ¿ plasticamente representada pelos famosos sacos de lona preta que embalavam os corpos dos soldados mortos ¿ para que a população dissesse não. É possível derrotar novamente a farsa, e como se tem assistido, ela é ainda causadora de mais terrorismo. É necessário. E nós vamos fazer isso.



publicado por albardeiro às 20:12
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Está quase...

Domingo, Fevereiro 29, 2004


Este "POST" é, sobretudo, um excelente texto, pertinente, actual e histórico, sobre uma simples questão (que eu quase que me atrevo a dizer que é tudo a par da LIBERDADE, da JUSTIÇA, da "inclusão" e do "diálogo") a IGUALDADE . O seu autor é o meu amigo Hugo Fernandez. O ALBARDEIRO agradece e publica:


IGUALDADE Q. B.


Está em curso uma nova revisão constitucional, cujos trabalhos deverão estar concluídos em Abril. Não é um processo novo. De facto a Constituição da República Portuguesa de 1976 já sofreu quatro revisões: 1982, 1989, 1992, 1997. Independentemente do que sobre estas revisões se possa ajuizar, as alterações efectuadas enquadraram-se sempre no sistema democrático vigente, não alterando de forma substancial a matriz político-ideológica que presidiu à sua elaboração. Porém, no final do ano passado, fomos confrontados com a pretensão, por parte da maioria governamental, em alterar profundamente a Constituição portuguesa. O que esta revisão tem de substancialmente diferente em relação às anteriores ¿ e, por isso, de acrescida perigosidade ¿ é o facto de pretender uma mudança do próprio sistema democrático. Mais do que uma simples alteração normativa de competências, âmbitos ou eficácia da actual organização da nossa vida colectiva, a revisão constitucional que a direita propõe visa a alteração da matriz político-ideológica da própria democracia. Trata-se de uma revisão radical dos princípios básicos do texto fundamental, que tem como corolário a substituição do princípio da Igualdade pelo da equidade. Ora esta substituição, parecendo coisa insignificante é, pelo contrário, decisiva. A propósito, e com a perspicácia que lhe é reconhecida, o cartonista Luís Afonso referia no seu ¿Bartoon¿ do jornal Público de 30 de Dezembro de 2003 que esta ¿ a equidade ¿ era a ¿igualdade q.b.¿. O humor da citação não esconde a gravidade da situação. Quer do ponto de vista político, quer do ponto de vista jurídico, estamos perante uma enorme mudança. Apesar de tudo, este processo de revisão que arrancou em Janeiro e que se pretende esteja concluído a tempo das comemorações dos 30 anos da Revolução dos Cravos (suprema ironia!), parece estar votado ao fracasso, pelo menos no grau e extensão pretendidos. A recusa generalizada da oposição em discutir os aspectos mais subversores do actual sistema ¿ inviabilizando, assim, a maioria qualificada de dois terços dos deputados, necessária para a aprovação de qualquer alteração constitucional ¿ está garantida. No entanto, a possibilidade de uma ¿refundação ideológica¿ do regime democrático e do modelo social em que vivemos é uma ameaça real, senão a curto, pelo menos a médio prazo. Paulo Portas, o principal mentor desta proposta, já preveniu que esta é uma batalha longa e que o objectivo imediato é tão-só o de lançar as bases programáticas para uma alteração futura.


Enquadramento político-constitucional


O desaparecimento da ideia de Igualdade na nossa lei fundamental faz-nos recuar, em termos dos direitos e garantias dos cidadãos, cerca de 200 anos. Aquilo que passa por ser novidade, não é mais do que a recuperação de lógicas passadas, profundamente retrógradas e anquilosadas. De facto, a possibilidade da introdução de normas de diferenciação no texto constitucional, darão azo a todo o tipo de discriminações. A distinção casuística das situações e a definição arbitrária dos critérios de necessidade, ferem mortalmente o carácter universal da lei e a imparcialidade e justeza da sua aplicação. De resto, sempre assim foi. Foi longo e penoso o caminho percorrido na luta pela conquista da democracia e dos direitos cidadania, face a uma lógica política e social aristocrático-corporativa, própria das sociedades europeias dos séculos XVII e XVIII, que consagrava a desigualdade, o privilégio, a rigidez hierárquica e o arbítrio, como a ¿ boa ordem das coisas¿. Até à consagração dos princípios igualitários na primeira Constituição portuguesa de 1822 e até hoje, é expressiva a permanência destes valores em todas as constituições portugueses que derivaram de processos democrático-parlamentares (excluímos, portanto, os textos constitucionais outorgados ¿ a Carta Constitucional de 1826 ¿ ou impostos ¿ o caso da Constituição do Estado Novo, em 1933). A Constituição de 1822 estatuía no seu artigo 9º que ¿A lei é igual para todos. Não se devem portanto tolerar privilégios do foro nas causas cíveis ou crimes, nem comissões especiais.¿ O conceito genérico de Igualdade perpassava, de resto, todo o texto constitucional, encontrando especial expressão em vários artigos do título I ¿Dos Direitos e Deveres Individuais dos Portugueses¿. O mesmo postulado está consagrado no artigo 10º do título III ¿ ¿Dos Direitos e Garantias dos Portugueses¿ ¿ da Constituição de 1838. Com a proclamação da República não se verificaram, neste aspecto, alterações. Integrada no título II da Constituição de 1911 na rubrica ¿Dos direitos e garantias individuais¿ a ideia de Igualdade está consagrada no seu artigo 3º. A Constituição da República Portuguesa de 1976, saída da Revolução do 25 de Abril, contemplou este preceito na sua Parte I, ¿Direitos e Deveres Fundamentais¿ e, concretamente, no seu artigo 13º que, aliás, permaneceu de forma textual nas revisões constitucionais que lhe sucederam: ¿1. Todos os cidadãos têm a mesma dignidade social e são iguais perante a lei.¿ Acresce que no seu artigo 9º, alínea d, a Igualdade que se estabelece como meta político-constitucional é a igualdade real e não só igualdade jurídica (igualdade formal): ¿São tarefas fundamentais do Estado: (...) d) Promover o bem estar e a qualidade de vida do povo e a igualdade real entre os portugueses, bem como a efectivação dos direitos económicos, sociais e culturais, mediante a transformação e modernização das estruturas económicas e sociais.¿ A Igualdade ¿ que não homogeneidade massificadora ou estandardização ¿ sempre foi, como vemos, um princípio básico da democracia. É o que agora se quer pôr em causa. Trata-se seguramente de um sintoma dos nossos tempos, em que o primado normativo das leis parece estar entregue à avidez e desregulação do mercado. Dificilmente se pode considerar democrático um discurso político-legal que não consagre a universalidade dos direitos e deveres dos cidadãos. Dificilmente pode ser democrática uma matriz ideológica baseada no privilégio e na discriminação. A ¿igualdade q. b.¿ só pode representar desigualdade acrescida. É sintomático que, em recente artigo publicado no jornal Público de 21 de Fevereiro de 2004 , o insuspeito pensador liberal inglês sir Ralf Dahrendorf não hesite em alertar para os perigos da utilização da discriminação positiva no âmbito dos direitos de cidadania, interrogando se precisamente esta não estaria a produzir ¿ diríamos nós reproduzir ¿ ¿um novo tipo de segmentação rígida que destrói a própria sociedade civil que pretendia criar¿, para concluir que ¿Direitos iguais para todos os cidadãos são fundamentais para uma ordem liberal.¿


Sobre a jurisprudência


Será o conceito de Igualdade tão fundamental e a sua substituição, no âmbito do texto constitucional, tão determinante? Pensamos que sim. Também do ponto de vista jurídico. Com efeito, é o carácter universal, derivado do princípio igualitário, que define a lei e a distingue do privilégio. Como referiu Rousseau no seu Contrato Social, ¿toda a função que se refere a um objecto individual, não pertence ao poder legislativo¿ e, tendo em conta o contexto da época em que escreveu, acrescentando que ¿o que ordena o mesmo soberano acerca de um objecto particular, também não é lei, mas um decreto; nem um acto de soberania, mas de magistratura.¿ Uma lei privada não pode, assim, ser um acto legislativo. Este tem que possuir as características da generalidade e da abstracção. Só a própria universalidade da Lei confere dignidade ao tratamento do caso concreto. A natureza abstracta da norma jurídica tem que sacrificar em todos as circunstâncias a singularidade do caso concreto à universalidade da regra, o que a torna inquestionavelmente imperfeita. Mas o conteúdo da Lei, o seu significado e alcance resultam necessariamente do entendimento e modo de organização da sociedade na qual intervém e para a qual contribui. Este carácter trans-pessoal do Direito é, por isso, muito mais do que um mero acto de positivismo jurídico, já que resulta de um equilíbrio ideal das preocupações lógicas e axiológicas na aplicação da norma ao caso concreto sub judice. Por isso, sendo a Lei a expressão formal da Justiça e a estrutura instrumental do Direito, este não pode reduzir-se-lhe, já que a intenção normativa claramente o ultrapassa. O verdadeiro sentido normativo terá que ir para além do mero formalismo teórico e, através de uma valoração jurídica ¿ derivada de determinada visão do mundo e enformada por determinadas perspectivas ideológicas, referidas a uma realidade histórica concreta ¿ permitir uma eficaz intervenção social. Em vez de uma lógica formal puramente dedutiva, persegue-se a escolha ¿ ainda que necessariamente fundamentada ¿ do razoável. A atenção ao concreto e ao singular, a importância atribuída à situação e ao contingente, própria da vivência e historicidade humanas, não pode, no entanto, significar um regresso à subjectividade e ao arbítrio. E é isto que as intenções agora vindas a público pretendem consagrar numa futura Constituição, ao substituir o conceito universal de Igualdade pela aplicação casuística de uma proclamada equidade. Por outro lado, decorre também do próprio princípio da Igualdade uma preocupação diferenciadora a partir de uma lógica distributiva, no sentido do tratamento igual de situações iguais ou semelhantes e tratamento desigual de situações desiguais ou dissemelhantes. A igualdade perante a lei exige não que todos sejam tratados de forma idêntica independentemente das circunstâncias, mas que recebam tratamento semelhante os que se encontram em condições semelhantes. Ou seja ¿tratar por igual aquilo que é essencialmente igual e desigualmente o que é essencialmente desigual¿. Desta forma, pretende-se que a Justiça dê a cada um o que lhe pertence. As soluções assim encontradas são, não só equilibradas, como legítimas. Um tratamento diferenciado, procura alcançar uma igualdade substantiva, desde que assente em motivos e circunstâncias objectivas e razoáveis. Só assim a diferenciação é legítima e se evitam os privilégios. É que igualdade não se pode confundir com identidade. A diferenciação impede, por isso, o arbítrio e a discriminação ilegítima. E se a discriminação é sempre injusta, a diferenciação promove a justiça, desde que tenha, precisamente, a Igualdade como referencial normativo. Assim, a eliminação do primado da Igualdade abre uma porta inevitável à consagração da discriminação. Ainda que se entenda esta de forma positiva, em favor dos mais desfavorecidos, esse mesmo estatuto social, inscrito na Constituição, acabaria por ficar indelevelmente consignado como realidade perene e tendencialmente imutável. Perpetuava-se, através da normatividade, uma determinada hierarquização e estratificação social. Porque o direito de igualdade implica da sociedade o desenvolvimento dos mecanismos necessários para a promoção ou obrigação de igualdade, tal não pode ser tolerado. Não é por acaso que o artigo 6º da Constituição corporativa de 1933, no seu número 3, inculcava, de facto, uma ideia de desigualdade social ao enfatizar a incumbência do Estado de ¿zelar pela melhoria das condições das classes sociais mais desfavorecidas¿ (itálicos meus), bem como de um eufemístico propósito do acesso de todos aos ¿benefícios da civilização¿ ¿ estabelecendo-se, portanto, que uns eram civilizados e outros não ¿, propósitos só compreensíveis no contexto autoritário e imperial da época. A universalidade dos direitos assusta as mentes mais retrógradas. E a sua contestação é demagogicamente feita com o princípio da equidade que, diferenciando supostamente em benefício dos mais carenciados, promete a justiça social . Mas esta aparente discriminação positiva não passa da referida ¿igualdade q. b.¿. Abrir-se a possibilidade constitucional de tratamento diferenciado dos cidadãos, introduz-nos no reino do arbítrio e da discricionaridade. Aliás, a verdadeira justificação ideológica para esta alteração é clara e foi dada pelo líder da bancada parlamentar do PSD, Guilherme Silva, ao Público de 29 de Dezembro de 2003, aquando do início dos trabalhos da revisão: ¿Propomos a introdução do princípio da gratuitidade progressiva para os mais carenciados, porque o Estado não tem meios para a gratuitidade universal, isso era o objectivo de uma sociedade sem classes¿. Elucidativo! Talvez uma efectiva aplicação da justiça fiscal pudesse obviar a essa falta de recursos do Estado e, por esse meio legítimo de diferenciação, conduzir-nos a uma sociedade mais justa e igualitária. Na mesma ocasião e, embora de forma mais agressiva e ainda mais demagógica, Telmo Correia, o líder parlamentar do PP, declarou que ¿se um estrangeiro ler o preâmbulo da Constituição ficará convencido que está em Cuba, pois ele faz o enquadramento de um país a caminho do socialismo¿. Comentários para quê? Pode-se e deve-se aspirar ao seu aperfeiçoamento e ao alargamento efectivo das condições da sua aplicação. Mas o que não oferece dúvidas é que o conceito de Igualdade é parte constituinte de qualquer sociedade que se queira democrática e o seu mais precioso horizonte utópico. Isto mostrou-nos, à saciedade, a luta de séculos dos povos. Não se percebe, por isso, que um partido como o PSD, de matriz liberal-democrática, renegue este princípio e dê o seu aval a semelhante alteração, num claro processo de reescrita da História. Cabe sobretudo perguntarmo-nos, uma vez que declaradamente se recusa o paradigma jurídico-político fundador do sistema democrático, a que obscuros paradigmas foi o PP buscar a sua matriz político-ideológica.



publicado por albardeiro às 20:07
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Outro...

Quarta-feira, Fevereiro 11, 2004


Conto de dois impérios


Atente-se no que escreveu Miguel Sousa Tavares sobre a mentira das armas de Saddam: Não vou maçar outra vez os leitores a tentar explicar porquê que Bush quis tão veementemente comprar uma guerra no Iraque. O grande mistério, para mim, permanece saber porquê que Blair o seguiu cegamente e se viu encostado a um grupo de gurus da extrema-direita americana que defende a total prevalência da vontade e dos interesses americanos sobre quaisquer outras considerações, com o consequente abandono, se necessário, da ONU e das regras de direito internacional que, mais ou menos bem, têm regulado os conflitos no mundo desde a Conferência de São Francisco e o nascimento da Sociedade das Nações. Quem são os Parvos?! (Provavelmente serei um...!) Continuámos a ler José Arbex Jr.* e de facto... temos que ¿POST¿(AR) mais um escrito!


O ¿vassalo¿ Blair tem de dar satisfações aos seus eleitores; o ¿amo¿ Bush provavelmente não corre o risco de perder o cargo.


A morte do cientista britânico David Kelly, ocorrida no dia 18 de Julho, por aparente suicídio, lançou novas evidências de que um bando de delinquentes (na verdade não vejo outro termo para os definir, são semelhantes aos que dizem combater!) ocupa os centros do poder mundial. Kelly, 59 anos, especialista em armas biológicas, ajudou a produzir um dossiê para o governo britânico sobre o poder bélico de Saddam Hussein. O dossiê foi apresentado ao Parlamento britânico, em Setembro de 2002, porém adulterado (agora dizem que o erro foi das secretas!), para atribuir a Hussein muito mais poder do que de facto tinha. Em Maio, a emissora pública BBC denunciou a manobra, citando ¿uma fonte¿ do serviço secreto britânico. O governo chefiado por Tony Blair desmentiu, e chegou a exigir a retractação da emissora. Kelly, sob suspeita de ter sido a ¿fonte¿ da BBC, passou a ser pressionado por jornalistas e políticos. Nessa condição, foi submetido a uma investigação da Comissão das Relações Exteriores da Câmara dos Comuns. Dia 18, foi encontrado morto, com o pulso esquerdo cortado. A BBC admitiu, depois disso, que ele foi mesmo a ¿fonte¿ da denúncia. Ultimamente, ao longo das últimas semanas, a Casa Branca foi levada a confirmar que as supostas armas de destruição em massa foram, de facto, apenas um pretexto para a invasão.


As Diferenças


Tony Blair sentiu/sente pressões para renunciar, mas tem afirmado que pretende manter o cargo de primeiro-ministro. O seu governo está em crise. George Bush permanece impávido na Casa Branca, quando muito, dá entrevistas trapalhonas à comunicação social ¿patriota¿ . Não só não se fala em impeachment presidencial, como a polícia política age com crescente desenvoltura nos Estados Unidos. A diferença entre os dois casos é determinada por vários factores.


Primeiro: Blair é membro de um partido que, supostamente, faz parte do campo da esquerda (às vezes adjectivada como ¿socialista¿, outras como ¿social-democrata¿ e outras, ainda, como ¿democrática¿; Blair foi, com Bill Clinton, um dos proponentes da suposta ¿Terceira Via¿). Bush, ao contrário, representa declaradamente o que existe de mais reaccionário na direita estadunidense. É fundamentalista, da seita born again christians (cristãos renascidos), que acredita no ¿destino manifesto¿ de os Estados Unidos serem a primeira entre as nações. Assim, enquanto o vassalo Blair tem de multiplicar as explicações aos seus partidários e eleitores, o seu amo Bush age com perfeita coerência.


Segundo: Blair está na União Europeia (será que conta para alguma coisa?). A invasão do Iraque colocou um holofote sobre a competição económica, geopolítica e cultural travada entre os vários imperialismos (estadunidense, alemão, francês, britânico e, porque não, o russo). Para ficar bem com Bush e os oil men do Texas, Blair foi obrigado a chegar ao limite da ruptura com a UE, o que, evidentemente, provocou grandes tensões dentro da Grã-Bretanha. Bush, ao contrário, sente não dever (dar) explicações a ninguém, incluindo a Organização das Nações Unidas (ONU), a Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN) e a UE. Ostensivamente, a Casa Branca dispensa as alianças e ignora os eventuais compromissos diplomáticos, até mesmo com antigos aliados.


Terceiro e certamente mais complicado: a questão ideológica conjuntural. A Europa viveu/vive um momento de grandes tensões e manifestações, como o do funcionalismo público contra a reforma do sistema da Segurança Social (em Portugal, como sempre, espera-se que a coisa caia de podre! Depois está tão podre que já não vale a pena...). Lembram-se ainda das passeatas de milhões (alguns falam em 6, outros próximo dos 30) contra a invasão do Iraque, no ano passado um pouco por todo o Mundo, foram uma demonstração disso. Nos Estados Unidos também houve muitas manifestações, principalmente nas grandes cidades. Mas não podem ser comparadas, em impacto, àquelas que paralisaram a Europa. Além disso, a reprovação da opinião pública ao ataque diminuiu com rapidez directamente proporcional ao número de baixas estadunidenses. Isto é, muitos não condenavam a invasão por ser um acto de agressão e pirataria, mas sim por temerem um grande número de mortes estadunidenses; quando isso não se verificou, a popularidade de Bush cresceu.


Império e República


Como explicar esse quadro? Vários escritores, historiadores e intelectuais das mais variadas origens e filiações ideológicas ¿ de Gore Vidal a Michael Hardt e António Negri, passando por John Kenneth Galbraith ¿ viram nisso o perigoso avanço do império sobre a república americana. Bush seria a encarnação da vocação imperial dos Estados Unidos. Os interesses do império (no caso, reservas de petróleo e estratégia geopolítica) e a sua capacidade de garantir uma vida confortável a uma vasta classe média falam mais alto do que a convivência civilizada entre as nações e do que os princípios da democracia interna. Gore Vidal notou que a própria condução de Bush ao poder, em Dezembro de 2000, quando a ¿Suprema Corte¿ estuprou a Constituição para escolher como presidente o perdedor da eleição, abriu caminho para o despotismo. ¿A velha república é uma sombra dela mesma, e vivemos sob a luz forte de um império nuclear mundial com um governo que vê como seu verdadeiro inimigo - ¿nós, o povo¿ -, destituídos do nosso direito eleitoral garantido¿, afirmou. Os próprios fundadores dos Estados Unidos, profundos conhecedores da história do Império Romano e influenciados pelo iluminismo francês, já demonstravam preocupação com a vocação imperial que impregnava a ideologia do ¿destino manifesto¿. Thomas Jefferson dizia temer pelo futuro do seu país, ao reflectir sobre a justiça divina. Benjamin Franklin, já perto da morte, em 1787, ao ler, pela primeira vez, a constituição proposta à Convenção Constitucional, em Filadélfia, redigiu a seguinte nota: ¿Acredito que esta [forma de governo proposta] deverá ser bem administrada durante muitos anos e poderá terminar no despotismo, como já fizeram outras formas antes dela, apenas quando o povo se torne a tal ponto corrompido que precise de um governo despótico, tendo se tornado incapaz de suportar qualquer outro¿. Quase cem anos depois, no final da Guerra de Secessão (1861-65), foi a vez de Abraham Lincoln alertar contra o crescente poder corruptor das corporações, e de lembrar que contra elas, as corporações, tinha sido feita a revolução de 1776. ¿Por mais corrupto que o nosso sistema se tenha tornado ao longo do último século ¿ e eu vivi três quartos dele ¿, ainda nos apegávamos à Constituição e, sobretudo, à Carta dos Direitos [a declaração formal dos direitos dos cidadãos americanos, incorporada na Constituição através das emendas 1 a 10]. Por piores que as coisas ficassem, eu nunca imaginei que chegaria a ver grande parte da nação ¿ nós, o povo - passar sem ser consultada ou representada numa questão envolvendo guerra e paz, nem se manifestar em números tão grandes contra um governo arbitrário e conspirativo que prepara e conduz guerras (contra nós) ou, pelo menos, para que um Exército recrutado entre os desempregados possa combater nelas¿, disse Gore Vidal. As perspectivas, deste ponto de vista, são sombrias. Mas o seu desfecho ainda não está definido. Em 1940, as previsões de Adolf Hitler sobre o ¿Reich de mil anos¿ eram uma ameaça aparentemente factível; cinco anos depois, a Alemanha nazi estava em ruínas. Em 1991, o império soviético desabou com uma rapidez nem sequer imaginada pelo mais alucinado futurólogo. A história não chegou ao fim, nem pode ser domesticada. Há uma possibilidade de que Bush venha a ser lembrado como o coveiro da república americana; mas há também a possibilidade, nada pequena, de que se torne conhecido como um infeliz falastrão, tanto quanto já o é o vassalo Tony Blair, para não falar nos bobos ibéricos e seus lambe botas. ·*José Arbex Jr., para além de escrever muitas coisas, é sobretudo jornalista.



publicado por albardeiro às 19:57
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Continua!

O ¿POST¿ que segue é mais um texto enviado pelo meu amigo Hugo Fernandez, aliás, publicado no último número da Seara Nova. Como é um pouco extenso será ¿postado¿ em fatias...


O ¿EIXO DO BEM¿? REFLEXÕES SOBRE O DOMÍNIO IMPERIAL NORTE-AMERICANO


No discurso pronunciado a 20 de Setembro de 2001, na sequência dos atentados às Twin Towers e ao Pentágono, George W. Bush faz esta espantosa afirmação: ¿Cada país, cada região, deve agora escolher: ou estão connosco, ou estão com os terroristas. Esta luta é do mundo inteiro. É uma luta de civilização.¿ Para além do aspecto caricatural desta visão do mundo e do esquematismo desta chantagem grosseira, exigindo a vassalagem incondicional do mundo ao poder americano, é a agressividade da linguagem do presidente norte-americano que mais impressiona. A arrogância deste ultimatum corresponde ao estatuto ímpar dos E.U.A no mundo de hoje, que o ministro francês Hubert Védrine designou por hiperpotência. De facto, desde a desagregação da União Soviética e o fim da Guerra Fria, a hegemonia americana não oferece dúvidas. Acresce que a actual administração norte-americana, na sequência de tendências que tinham surgido em governos anteriores, optou decididamente por uma política belicista e por uma ¿cruzada¿ contra o Mal que, pelo seu efeito de atracção sobre a generalidade de uma população ignorante e infantilizada, é verdadeiramente trágica. Como diz Bush, com um assinalável cinismo, ¿É uma luta de civilização¿. Um pouco à semelhança, afinal, do maniqueísmo das posições próprias do fundamentalismo islâmico ¿ qual reverso da mesma moeda ¿ de que, aliás, os E.U.A foram os principais patrocinadores e também as principais vítimas. Ao descurar outros campos de intervenção e protagonismo e ao privilegiar exclusivamente uma estratégia guerreira, baseada em tecnologias militares de ponta, os norte-americanos parecem ter assegurado o domínio do planeta. Esta opção, tomada muito antes dos acontecimentos do 11 de Setembro, tem a sua grande base de apoio no gigantesco poder do complexo tecnológico-militar, cuja teia de interesses e cumplicidades se estende ao actual governo e guia a sua acção. Diga-se, em abono da verdade, que do ponto de vista americano com assinaláveis êxitos. De facto, desde a conquista militar do Afeganistão e do Iraque, até ao controle do Médio Oriente por intermédio de um apoio incondicional a Israel, passando pelo estabelecimento de bases militares nas ex-repúblicas soviéticas da Ásia central, assistimos a uma presença reforçada das tropas americanas em regiões do mundo que, até agora, fugiam ao seu controle directo. Isto para além do domínio absoluto do continente americano e da forte presença no Extremo Oriente e em pontos estratégicos de África. A coberto de uma pretensa luta anti-terrorista, mascaram-se os verdadeiros interesses no acesso às fontes de combustíveis, como o petróleo ou o gás natural e o controle das principais rotas comerciais, com vista a assegurar uma supremacia global. Estaremos, no entanto, a falar de um domínio da mesma natureza daquele que já existia anteriormente? Pensamos que não. Aparentemente vitorioso e incontestado, este domínio revela, de facto, fragilidades insuspeitas. São aliás essas dificuldades que explicam a própria agressividade da postura norte-americana. Paradoxal? Atentemos nalguns aspectos.


UMA ECONOMIA EM DECLÍNIO


Desde logo, no aspecto económico. É neste preciso momento de máximo domínio militar e estratégico que, curiosamente, os E.U.A têm o défice comercial mais elevado do mundo, dependendo, como nunca, do exterior. De facto, a América encontra-se, do ponto de vista económico, extremamente vulnerável, uma vez que as importações necessárias para alimentar um mercado interno insaciável são muito superiores às actuais exportações americanas. Os Estados Unidos já não conseguem produzir o suficiente para o seu sustento. Este constitui um facto inédito na história contemporânea. Em 2001, o défice norte-americano atingia os 366 mil milhões de dólares ¿ aproximadamente 3500 vezes o produto total de um país como Portugal -, sendo a maior fatia em dívida à China, seguida do Japão e da União Europeia (e desta, quase metade à Alemanha). De 1995 para 2000, a importação de produtos industriais não cobertos pelas exportações passou de 5% para 10%. Acresce a esta situação, a constante valorização da moeda europeia face ao dólar, com uma expressão nunca antes vista. E apesar desta valorização do euro poder significar, a curto prazo, uma perda do poder concorrencial das exportações europeias, parece certo que também reflecte a crescente confiança de zonas do mundo cada vez mais alargadas na capacidade económica dos países da UE, em detrimento da tradicional hegemonia americana, conforme ficou definida após a Segunda Guerra Mundial, em Bretton Woods. A ordem monetária e económica baseada no dólar está em crise. Para salvar a sua economia, os E.U.A são forçados, contra as regras de mercado livre que supostamente defendem e a que querem obrigar os outros países, a promoverem cada vez com mais frequência políticas económicas proteccionistas e a enveredarem por constantes ¿guerras comerciais¿ com o resto do mundo. Aliás, muita da estratégia militar americana visa precisamente o controle das fontes energéticas a nível mundial, já que o petróleo representa cerca de um quinto do total das suas importações. Mas não porque haja perigo imediato de escassez destes produtos para o consumo predador dos americanos e sim para impedir qualquer outro país de ter a possibilidade de fazer concorrência aos E.U.A. Recupera-se, desta forma, o sentido estratégico da opção militar que consta no famoso texto de Março de 1992, apresentado no final do mandato de Bush sénior ¿ o Relatório Cheney-Rumsfeld-Khalilzad (qualquer deles, sublinhe-se, altos responsáveis da actual administração americana) ¿ que, sem ambiguidades, defende que ¿a missão da América consiste em assegurar que nenhuma outra superpotência possa emergir no resto do mundo. Poderemos consegui-lo convencendo todos os restantes países industriais avançados de que os E.U.A defenderão os seus interesses legítimos e mantendo um potencial militar suficiente.¿ E conclui, dizendo: ¿Os E.U.A deverão instaurar mecanismos a fim de dissuadirem os concorrentes potenciais de procurarem ter a pretensão de desempenhar um papel regional mais importante ou um papel mundial.¿[1] Esclarecedor!


A CRISE IRAQUIANA


A hegemonia americana precisa, assim, de se afirmar pela força das armas. Não porque exista qualquer ameaça real ao seu domínio. Mas porque é necessário garantir que não haja qualquer hipótese de concorrência nem muito menos de paridade. O Império sente-se ameaçado. E isso, longe de constituir uma posição de força constitui, pelo contrário, uma declaração de fraqueza. Como afirmou recentemente o historiador americano Immanuel Wallerstein, a perda do domínio económico e ideológico e a sua substituição por uma hegemonia exclusivamente militar, é uma situação característica das potências em declínio[2]. De facto, no momento em que o domínio imperial americano parece ter atingido o seu ponto máximo, talvez nunca tantas pessoas, instituições e governos em tantos países diferentes do mundo, tenham assumido abertamente as suas divergências perante a política dos E.U.A. Generaliza-se uma atitude de reserva, quando não de claro repúdio, face à crescente hegemonia norte-americana. A opção da actual administração norte-americana por uma política externa abertamente agressiva, faz com que a relação dos E.U.A com os outros países do mundo se apresente de forma substancialmente diferente. É certo que, desde sempre, os E.U.A se revelaram uma potência agressiva, não hesitando em empreender acções militares directas contra outros países ou em fomentar golpes de estado ou acções violentas em vários pontos do mundo, na defesa dos seus interesses. Havia, no entanto, outros factores de hegemonia que iam desde o domínio económico ao domínio político e ideológico, que agora estão claramente enfraquecidos e subalternizados. A sobranceria do poder militar absoluto e o egocentrismo agressivo que advém de uma pretensa superioridade moral leva, por outro lado ao desprezo pelo papel das instâncias e dos organismos internacionais e principalmente da ONU. Não é de admirar o repúdio generalizado a tais pretensões. A crise iraquiana é, a este respeito, paradigmática. Por isso, personalidades insuspeitas de terem quaisquer simpatias de esquerda ou tentações anti-americanas, como é o caso de Adriano Moreira, numa recente intervenção no ciclo de conferências ¿Não à Guerra ¿ o Desconserto do Mundo¿, no Porto, fez esta sugestiva afirmação: ¿Da nova ordem internacional, só sei que acabou a antiga¿. Crítico assumido da invasão unilateral norte-americana do Iraque, este professor universitário reconhece o profundo mal-estar que esta intervenção provocou sobretudo entre os E.U.A e os seus aliados europeus ¿ com conhecidas excepções ¿ apelando, aliás, para a necessidade de não acentuar a divisão existente e ¿deitar fora um património que levou meio século a construir¿. Este foi, sem dúvida, um momento de ruptura e não uma mera divergência pontual. Com efeito, o vigor das críticas publicamente manifestadas face à guerra no Iraque pela França, pela Rússia, mas sobretudo pela Alemanha ¿ uma atitude inédita por parte de um dos países europeus considerados mais próximos dos E.U.A ¿, traduz grandes alterações nas relações trans-atlânticas A ponto do insuspeito Javier Solana, ex Secretário-Geral da NATO e actual Alto Representante para a Política Externa e de Segurança Comum da União Europeia ter desabafado que as ¿relações Europa-E.U.A não melhoram com sorrisos¿[3]. Esta divisão é tão acentuada que começam a surgir em Washington vozes que se interrogam sobre se a emergência de uma Europa unida e alargada é do interesse dos próprios Estados Unidos. Talvez isso explique o descarado aliciamento dos americanos aos países de Leste candidatos à UE, bem como as intoleráveis pressões da Casa Branca no sentido de acelerar o processo de integração europeia da Turquia. Tal como o azedume das referências de Donald Rumsfeld ao que ele apelidou de ¿velha Europa¿, na tentativa de quebrar a unidade europeia o que, diga-se em abono da verdade, parcialmente conseguiu. Há, com efeito, que garantir aliados seguros e inquestionavelmente submissos. Nessa linha já se tinha assistido à imposição do alargamento da NATO a países do ex-bloco soviético, bem como a constantes humilhações da Rússia na cena internacional. Toda a situação política internacional, aliás, mudou. A manifesta dificuldade dos americanos em conseguirem convencer os países que actualmente têm acento no Conselho de Segurança das Nações Unidas ¿ países de peso internacional modesto como o Chile ou Angola ¿ em legitimar a sua aventura iraquiana, obrigou-os mesmo à embaraçosa retirada duma segunda resolução nesse sentido. Os seus propósitos ficaram assim excluídos do direito internacional e a sua acção tornou-se não só ilegítima como manifestamente ilegal. Mesmo países da região, como a Turquia ¿ membro da NATO ¿ ou a Arábia Saudita, tradicionais e fieis aliados dos E.U.A, recusaram liminarmente a presença das tropas americanas nos seus territórios e qualquer envolvimento no conflito vizinho. Trata-se de algo absolutamente inédito. A própria evolução da intervenção americana no Iraque é prova das enormes pressões a que os E.U.A estão sujeitos . Verificou-se o refreamento dos impulsos mais destruidores por parte dos chefes militares e dos ¿falcões¿ da administração norte-americana, que advogavam para o Iraque uma solução do tipo daquela levada a cabo no Japão no final da Segunda Guerra Mundial: bombardeamentos maciços das principais cidades iraquianas, com milhares de mortos ¿ o célebre efeito ¿choque e pavor¿ ¿ e o recurso, se necessário fosse, a armamento nuclear. Como se viu, a pressão da opinião pública americana e internacional, para quem tal perspectiva era pura e simplesmente intolerável, obrigou à adopção de outras soluções mais limitadas e ¿cirúrgicas¿. Estamos convencidos que foi também a força da opinião pública e dos governos de todo o mundo, que impediu uma escalada do conflito a países vizinhos, como a Síria, contrariando as intenções publicamente manifestadas pelas autoridades de Washington.


2ª PARTE


A FRAQUEZA DA FORÇA


A opção belicista da administração Bush está longe de constituir prova inequívoca de força. Antes revela uma indisfarçável ansiedade e insegurança. Pensamos que é precisamente o conhecimento que os E.U.A têm dos seus reais limites no controle do mundo, que provoca a brutal agressividade da política norte-americana. Tudo e todos são considerados uma ameaça, se não se mostrarem inteiramente subservientes aos diktats dos E.U.A. Aliás, no preciso momento em que o domínio imperial americano parece atingir o seu apogeu, é também o momento em que a hegemonia dos E.U.A é mais contestada. Não é por acaso que o historiador e ensaísta norte-americano Max Boot, ¿think tank¿ do poder neoconservador de Washington, defendeu, em recente entrevista ao jornal Público, que se os E.U.A não conseguissem promover os seus valores e ideias no mundo, perderiam a guerra contra o terrorismo e veriam a seu domínio planetário altamente comprometido[4]. Esta simples constatação mostra como a ferida está aberta e a crise instalada. A situação não está tão controlada como poderíamos pensar. A administração Bush necessitou, por tudo isto, de lançar a ideia da ¿guerra permanente¿. O próprio Bush afirmou, no seu célebre discurso de 20 de Setembro de 2001, na sequência dos atentados de Nova Iorque e Washington, que ¿Os americanos não devem esperar uma única batalha, mas uma longa campanha sem precedentes.¿ Mesmo que a ameaça seja meramente potencial e a guerra ganhe o estatuto de ¿preventiva¿. Há é que manter um constante estado de tensão internacional que justifique a política agressiva e hegemónica dos americanos. A extrema perversidade desta concepção explica a despudorada confissão feita pelo secretário adjunto de Donald Rumsfeld, Paul Wolfowitz, à revista Vanity Fair, segundo a qual se admitiu que a existência dos arsenais de armas proibidas não foram a principal razão para a invasão do Iraque. Para este responsável da administração norte-americana, ¿Por razões burocráticas centrámo-nos numa questão, as armas de destruição maciça, porque era o único motivo sobre o qual todo o mundo se podia entender¿[5]. Por ¿razões burocráticas¿!? A total desfaçatez desta declaração, mostrando sem margem para dúvidas a intencional sobreavaliação do perigo que o regime iraquiano constituiria para os países vizinhos, mostra até que ponto pode ir a nova administração americana na persecução dos seus objectivos e na manutenção da sua estratégia belicista. O próprio secretário da Defesa norte-americano, Donald Rumsfeld, em recentes declarações à imprensa, colocou a possibilidade do dito armamento ter sido destruído antes do início da guerra, o que, sublinhe-se, tinha sido precisamente a condição imposta pelos próprios americanos ao Iraque para que a guerra não existisse. O regime iraquiano tinha, afinal, cumprido a principal exigência do Conselho de Segurança da ONU e dos próprios E.U.A, para evitar uma guerra que sabia ser o seu fim. É tal a gravidade deste gigantesco embuste, que nos próprios E.U.A, membros do Senado pedem explicações formais à Casa Branca e duvidam das reais motivações da intervenção americana e da política externa de George W. Bush. À semelhança do que, aliás, acontece com os deputados britânicos que na Casa dos Comuns acusaram Tony Blair de exagerar propositadamente a ameaça do arsenal de Saddam Hussein, exigindo a apresentação de provas da sua existência. O desenrolar da operação militar no Iraque mostra, pelo contrário, que o potencial bélico do regime iraquiano era irrelevante ¿ exaurido que estava por anos de sanções internacionais e de privações de toda a ordem ¿ e que a proclamada ameaça de armas de destruição maciça não fazia sentido. Pura e simplesmente não existiam. Ninguém duvida que, se Saddam Hussein tivesse tal tipo de armamento, no estertor do seu regime, certamente teria feito uso desta ¿última cartada¿. Como se sabe, no passado, o ditador não hesitou no uso de armas químicas contra a sua própria população. Tal como nunca existiram as proclamadas ligações entre o regime iraquiano e a Al-Qaeda, conforme foi recentemente revelado por dois dos mais altos responsáveis dessa organização, capturados no Paquistão e detidos nos E.U.A. Abu Zubaydah, responsável pelo planeamento e recrutamento da rede terrorista e o chefe operacional Khalid Sheikh Mohammed negaram, em distintos interrogatórios à CIA, qualquer colaboração com o regime de Saddam Hussein[6]. É fácil de perceber que seria pouco provável o entendimento entre um regime nacionalista laico, ainda que muçulmano, e um movimento fundamentalista islâmico. A


¿GUERRA INFINITA¿


Afinal de contas, o poderio tecnológico-militar acaba por ser o domínio em que os norte-americanos se superiorizam claramente a todos os outros países, atingindo quase a metade dos gastos mundiais em armamento. Isso explica, na nossa opinião, essa necessidade de manter constantemente um clima de tensão internacional e de agressividade guerreira. Um estado de permanente conflito; uma ¿guerra infinita¿. Esta é a matriz da sua supremacia e a justificação do seu poder. Para o antropólogo americano Emmanuel Todd, ¿Os Estados Unidos estão em vias de se tornar um problema para o mundo.¿[7]A proclamada ¿cruzada¿ anti-terrorista, não poderia constituir melhor pretexto para este papel. A diabolização de alguns países ¿ o¿Eixo do Mal¿- e a encarnação do inimigo na organização Al-Qaeda, são disso exemplos. Isso explicaria, por outro lado, a falta objectiva de empenho por parte dos E.U.A em resolver conflitos internacionais, como o que se verifica entre israelitas e palestinianos no Médio Oriente, para o qual tinham óbvia capacidade de intervenção. Pelo contrário, ali como em outras zonas do mundo, interessa aos norte-americanos manter um permanente foco de instabilidade, que permita justificar o seu poderio militar e a sua estratégia agressiva. Veja-se o próprio caso do Iraque. A perpetuação da ocupação militar deste país ¿ já se fala num período de 4 anos ¿ tem como justificação a necessidade de controlar uma situação generalizada de desordem, consentida senão mesmo fomentada pela passividade da actuação das tropas americanas, após o derrube de Saddam Hussein. Curiosamente, este estado de anarquia nunca se verificou em tudo o que diz respeito à produção petrolífera. Neste caso, não só as instalações e infra-estruturas nunca foram atacadas durante a guerra, como não sofreram qualquer saque ou destruição depois desta ter terminado. Os níveis de produção petrolífera já são semelhantes aos verificados antes do conflito. Não é aliás por acaso que numa recente sondagem do prestigiado grupo empresarial Gallup, realizada em 41 países, a opinião largamente maioritária indique que as intervenções militares no Afeganistão e no Iraque deixaram o mundo mais perigoso[8]. A omnipotência americana provoca, isso sim, uma crescente desestabilização do nosso planeta. Vamos mesmo mais longe. Para que a sua supremacia guerreira possa compensar a sua efectiva fragilidade económica, política e ideológica, os E.U.A deixam alimentar o ódio que crescente número de populações manifestam em relação ao seu domínio, provocando incompreensões e gerando revoltas que permitam posteriores reacções punitivas. Lembremo-nos, a este respeito, da evidente negligência no tratamento dos relatórios que circularam entre a CIA e o FBI, a propósito da presença de elementos e de actividades suspeitas, desenvolvidas em território americano por parte daqueles que, meses mais tarde, levariam a cabo os atentados de 11 de Setembro de 2001. Apesar de terem cometido um evidente erro de cálculo na dimensão e gravidade das consequências destes atentados, não podemos excluir a hipótese das autoridades norte-americanas terem propositadamente ¿fechado os olhos¿ às informações que iam recebendo, na esperança de que algum acto terrorista, embora de âmbito mais restrito, pudesse justificar o lançamento da sua estratégia belicista. Como, de facto, veio a acontecer. Esta hipótese aparece como demasiado inverosímil? Pois não o é, pelo menos a julgar pelas conclusões do relatório apresentado por uma comissão americana independente, chefiada pelo democrata Tim Roemer, membro da Câmara de Representantes dos E.U.A, que precisamente investiga os erros dos serviços secretos que terão contribuído para os ataques terroristas de 11 de Setembro de 2001. Esta deriva securitária que resulta da afirmação do poder absoluto americano no mundo tem, no entanto, também consequências a nível interno dos próprios Estados Unidos. À paranóia da segurança da ¿ilha americana¿ e do controle dos estrangeiros nas suas deslocações aos E.U.A, acresce um cada vez maior controle dos movimentos dos próprios americanos no seu país e restrições à sua liberdade. A sistemática invocação de situações de excepção, a coberto da suposta luta anti-terrorista, leva a constantes violações dos mais elementares direitos de cidadania. As ideias de liberdade ou democracia esvaziam-se de conteúdo, quando utilizadas até à exaustão por um governo cujos princípios e actuação pouco ou nada tem a ver com estes conceitos. Por isso, não podemos confundir a ideologia fundamentalista e totalitária da actual administração Bush, com a diversidade de opiniões e a complexidade da própria sociedade americana. As gigantescas manifestações de protesto nos E.U.A contra a guerra no Iraque aí estão para o demonstrar. Pensamos mesmo que será pela contestação a esta ordem de coisas, por um genuíno impulso democrático, que os americanos irão responder, primeiro que todos os outros, à ameaça extremista actualmente existente no seu país. As fragilidades apontadas destronam os E.U.A da condição de única super-potência mundial? Certamente que não. Mas condicionam sobremaneira o seu domínio, que não só não tem as mesmas características, como não conta com os apoios de épocas anteriores. Como muito bem diz o professor Fernando Catroga, ¿os europeus podem morrer por excesso de passado, e os americanos caminhar para o suicídio por julgarem que são futuro.¿[9] O poder agressivo e arbitrário só pode provocar o medo ou o repúdio. Nunca o respeito.


NOTAS


[1] Citado em Francisco Louçã e Jorge Costa, A Guerra Infinita, Porto, Afrontamento, 2003, p. 37. Para os dados sobre a economia americana ver pp. 41-42.


[2] Citado em Gustave Massiah, ¿O G8, um clube de ricos muito contestado¿, Le Monde Diplomatique (edição portuguesa), 14 de Maio de 2003, p. 15.


[3] Em entrevista publicada na Visão de 15 de Maio de 2003, p. 15.


 [4] Cf. Público, 1 de Junho de 2003, pp. 22-23.


[5] Cf. Público, 30 de Maio de 2003, p. 16.


[6] Cf. Público, 10 de Junho de 2003, p. 18.


[7] Cf. Emmanuel Todd, Após o Império, Lisboa, Edições 70, 2002, p. 11.


 [8] Cf. Visão, 15 de Maio de 2003, pp. 84-85.


[9] Cf. Público, 21 de Junho de 2003, p. 19.



publicado por albardeiro às 19:50
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(...)...!

Albardas e Alforges... nunca vi nada assim!


Vamos falar de coisas com pouca importância... às vezes chatas..., de política, de história, de sociedade!


Segunda-feira, Dezembro 29, 2003


Como escreveu à uns meses atrás *Sérgio Kalili : - Para defender a ¿democracia¿ contra o ¿eixo do mal¿, o presidente Bush escolheu a dedo uma equipa envolvida até ao tutano no caso Irão-Contras. Em nome da ¿democracia¿ e do ¿bem¿, George W. Bush desrespeita direitos, (re)escreve leis e autoriza a CIA a matar. Sem a Guerra Fria, vamos à guerra ao ¿terrorismo¿. Está na vez dos iraquianos, depois poderá ser a vez de colombianos, venezuelanos, norte-coreanos... (é verdade que alguns precisam de umas palmadas no rabo).Para isso, o presidente americano juntou o que há de mais encarniçado e de ¿linha dura¿, e pela forma como foi proclamado vencedor das eleições, ninguém esperava dele coisa diferente. Vamos então olhar algumas das figuras dessa equipa, de certo modo, um pouco sinistra que tem incendiado o mundo a todo momento. John Poindexter, almirante aposentado, é o director do Information Awarness Office do Pentágono e criador do TIA (Total Information Awareness), programa que (está) vai vasculhar a vida dos 290 milhões de habitantes dos EUA para ¿evitar ataques terroristas¿, ¿identificar o inimigo¿. Como em muitos outros casos de estranha intimidade entre sector privado e sector público, Poindexter deixou a Syntek Technologies, uma contratada do governo americano, para assumir o novo posto. Foi conselheiro de Segurança Nacional do ex-presidente Ronald Reagan. A Justiça condenou-o por conspiração, por mentir ao Congresso e destruir provas relativas ao escândalo Irão-Contras. Em 1990, o Congresso concedeu-lhe imunidade em troca do seu testemunho. Ele é um ardente defensor da política de desinformação, esquema que há muito tempo faz parte do cardápio dos governos americanos. Quando conselheiro nacional de Segurança de Reagan, defendeu a desinformação como ferramenta legítima para o avanço de interesses americanos. John W. Rendon, director executivo do The Rendon Group, não tem cargo oficial, mas as suas ligações no alto escalão rendem-lhe poder e contratos milionários e fazem dele figura influente no governo Bush. Começou do ¿outro lado¿. Foi director executivo de política nacional do Partido Democrata, director de gabinete do ex-presidente Jimmy Carter e analista político da BBC World TV. Mas, de repente, decidiu trabalhar arduamente para quem paga melhor. Nos últimos dez anos, o grupo de Rendon recebeu mais de 100 milhões de dólares do governo para provocar instabilidade no Iraque, manter o apoio internacional às sanções económicas àquele país (ao contrário dos relatórios de pesquisadores de Harvard e outras instituições considerarem essa política de uma crueldade indefensável) e preparar o público americano e mundial para a guerra. Explica um dos membros da equipa de Rendon sobre a campanha de instabilidade contra o Iraque: ¿A cada dois meses existiria um relato sobre bebés famintos no Iraque¿. E continua: ¿A exibição da foto das atrocidades (iraquianas) e o vídeo tinham sido mostrados em doze países. Era tudo parte da campanha concebida para manter as sanções¿. E, quando Bush-pai saía esbravejando que soldados iraquianos estavam roubando bebés de incubadoras de hospitais iraquianos, provou-se que era tudo fabricado. Hoje, o filho fala das poderosas armas de destruição em massa de Saddam, e ano após ano, em nome da ¿democracia¿ e dos ¿direitos humanos¿, os EUA conseguiram endurecer o embargo, proibindo até a ida de insulina para os diabéticos. No princípio do ano, antes da invasão, o grupo americano Voices in the Wilderness foi processado pelo Tesouro americano por levar medicamentos aos iraquianos.Rendon está presente em quase toda acção militar americana. Diz o editor Franklin Foer, da revista The New Republic: ¿Durante a invasão do Panamá, ele abrigou-se com líderes da coligação anti-Noriega. Na Guerra do Golfo, montou uma filial na Arábia Saudita para trabalhar em nome do emir exilado do Kuwait. Terminada a guerra, a CIA contratou-o para enfraquecer o poder de Saddam Hussein e promover os seus oponentes. Também ajudou nos conflitos do Haiti, Kosovo, Zimbabwe e Colômbia.¿ Outro exemplo do trabalho de Rendon e da sua empresa foi a exibição na televisão, mundo afora, de um balde com pó branco, supostamente 50 quilos de cocaína, na cozinha do general Manuel Noriega, e outro balde com sangue aparentemente para ser usado em ritual de vudu. Mais tarde revelou-se que os baldes continham apenas ingredientes usados na preparação de um tradicional prato panamiano.Segundo fontes do Pentágono, desde o ataque de 11 de Setembro Rendon já embolsou a pequena fortuna de 7,5 milhões de dólares por serviços prestados à recente ¿guerra contra o terror¿. John Dimitri Negroponte, embaixador americano na ONU, protegido do general Colin Powell, está à frente, junto com este, de muitas negociações entre Iraque, ONU e aliados. A sua nomeação sofreu inúmeros adiantamentos no Senado por causa de sua ficha. A nomeação de Negroponte por Bush-filho recebeu apoio público de outra figura malquista pelos direitos humanos: Henry Kissinger.Negroponte tem um passado obscuro e, como embaixador na ONU, soa um pouco estranha a ideia de que possui aval para condenar outras nações por abuso de direitos humanos. Pesa sobre ele a acusação de acobertar atrocidades cometidas pelas forças armadas das Honduras, quando embaixador naquele país nos anos da ¿Guerra Suja¿, de 1981 a 1985, durante a administração Ronald Reagan. País vizinho à Nicarágua, Honduras teve papel-chave como base para os ¿contras¿. Negroponte chegou a ser chamado por parte dos média como o boss da operação ¿Contras¿. Nos anos 80, centenas de hondurenhos foram sequestrados, torturados e assassinados pelo Batalhão 316, unidade secreta do Exército treinada pela CIA. Documentos então confidenciais, agora abertos ao público e outras fontes, mostram que a CIA e a embaixada americana tinham conhecimento de muitos crimes, incluindo assassinatos e torturas cometidos pelo Batalhão. Os Estados Unidos não só treinaram tais forças directamente, como pagaram para militares argentinos fazer parte do serviço sujo. ¿Os argentinos chegaram primeiro e ensinaram como desaparecer com uma pessoa. Os americanos tornaram-nos mais eficientes¿, disse Oscar Álvarez, ex-oficial das forças especiais das Honduras. A administração Reagan lutou com todas as forças e métodos contra o regime dito ¿marxista¿ da Nicarágua e contra os rebeldes de esquerda em El Salvador, Guatemala e Honduras. Somente na Guatemala, 200.000 pessoas morreram na ¿Guerra Suja¿. Honduras foi usada por Washington como principal base para essa luta clandestina. Em 1981, Jack Binns, embaixador nas Honduras, foi substituído à pressa por Negroponte, depois de alertar o Departamento de Estado(estava doido concerteza) sobre a violência contra o país. Com essa mudança, a ajuda militar às Honduras saltou de 3,9 milhões, em 1980, para 77,4 milhões de dólares em 1984. Povoada por equipamentos e pessoal americanos, Honduras passou a ser chamada de ¿USS Honduras¿. Disse Negroponte: ¿Não acredito que foi um problema de política governamental ou de direitos humanos¿. E acrescenta: ¿Existia uma tendência positiva do país em direcção à democracia¿. O director da Human Rights Watch/Americas, José Miguel Vivanco, apelidou Negroponte de ¿o embaixador avestruz¿. Otto Reich, outra figura importante na batalha contra os¿comunistas¿ e, agora, contra ¿terroristas¿, é o enviado especial à América Latina. Reich trabalha directamente para a conselheira nacional de segurança, Condoleezza Rice. No final de 2002 assumiu essa nova tarefa, que não requer confirmação do Senado. Foi antes, de forma provisória, secretário assistente de Estado para Assuntos do Hemisfério Oeste. Pelo seu passado, não conseguiu o ¿sim¿ do Congresso para se manter no cargo. Também foi peça-chave no escândalo Irão-Contras. E escolhido pela CIA para dirigir o extinto Office of Public Diplomacy. Segundo investigações do próprio governo, o escritório de Reich ¿empenhou-se no planeamento de actividades de propaganda proibidas e secretas para influenciar os média e o público¿. Plantava notícias, criava inverdades, lançava desinformação e pressionava editores e directores da comunicação social em favor dos ¿contras¿. O objectivo era espalhar o medo sobre a Nicarágua e o seu governo de esquerda sandinista, influenciando o Congresso para manter o financiamento aos paramilitares.Os boatos do passado assemelharam-se muito às notícias divulgadas em relação ao Iraque. Na época, anos 80, o escritório de Reich promoveu a fábula de que a Nicarágua havia adquirido armas químicas de destruição em massa da União Soviética, e que jactos MIG soviéticos estavam a chegar à Nicarágua. Por causa disso, considerou-se a possibilidade de um ataque militar ao país de Sandino. Como a equipa não muda muito de Reagan e Bush-pai para cá, a política da desinformação mantém-se. E assim, quando o Pentágono afirmou que um de seus mísseis atingiu o local de encontro dos líderes da Al-Qaeda no Afeganistão, mas o que os habitantes locais juraram foi que as vítimas eram camponeses, quem estava a falar a verdade? E que as bombas eram ¿cirúrgicas¿ e não representavam perigo para nenhum dos 3, ou seriam 5, os milhões de habitantes de Bagdade? Elliot Abrams, outro compadre do escândalo Irão-Contras presente no governo, é o actual. director do Conselho de Segurança Nacional. Abrams trabalhou como assistente do secretário de Estado, Ollie North, buscando fundos ilegais para os ¿contras¿. Em 1991, foi condenado depois de mentir ao Congresso americano a respeito do massacre, noticiado por jornais da época, na pequena aldeia salvadorenha El Mozote. Classificou a história de mentirosa, de propaganda comunista. Quando as Nações Unidas concluíram que 85 por cento das atrocidades na guerra civil de El Salvador foram cometidas por esquadrões assistidos pelo governo Reagan, Abrams respondeu: ¿O passado da administração em El Salvador é fabuloso¿. Mais tarde, Bush-pai concedeu-lhe o perdão. Collin Powell, o general secretário de Estado, é adorado pelos média. ¿Pode Colin Powell salvar a América?¿, perguntava a Newsweek. E continuava: ¿A figura mais respeitada na vida pública americana¿. Até mesmo a Rolling Stone: Powell é ¿confiante¿, ¿cândido¿ e ¿um tónico ao espírito público¿. New York Times: ¿honesto, forte, inteligente, modesto e resoluto¿. Mas a sua história não é assim tão livre de controvérsia. A morte de civis durante a Guerra do Golfo e a invasão do Panamá são consideradas triunfos. O colunista do Washington Post Colman McCarthy quebrou o panegírico da imprensa: ¿Em nome da paz, matam-se mulheres e crianças que apareçam no caminho das políticas americanas...¿.Powell também sabia e esteve envolvido no escândalo Irão-Contras. Mais tarde reconheceu isso em testemunho por escrito ao Congresso. Lembrava, à dois anos atrás, David Corn, editor da revista The Nation, em Washington: ¿Eu descobri em primeira mão indícios de que Powell havia mentido numa tentativa de esconder o escândalo Irão-Contras¿. O general conseguiu de Bush-pai perdão para o seu antigo boss, o ex-secretário de Defesa Caspar Weinberger, acusado de obstruir investigações sobre o caso Irão-Contras. Com o perdão, Colin bloqueou qualquer tentativa de julgamento que pudesse ter consequências desagradáveis para ele e para o antigo chefe. Powell declarou: ¿Como conselheiro de segurança nacional para Ronald Reagan, trabalhei no duro, lutei muito para apoiar os ¿contras¿, os guerreiros da liberdade, que foram a resistência ao governo comunista de Ortega na Nicarágua¿. Mais no início da carreira, ainda durante a Guerra do Vietname (embora não de forma explícita, o canal HISTÓRIA numa biografia sobre o general deixava no ar essa suspeita), o então major Colin Powell preferiu ignorar e encerrar denúncias de atrocidades e abusos contra civis vietnamitas ocorridos na vila de My Lai, em 1968. O caso ficou conhecido como ¿O Massacre de My Lai¿. Donald Rumsfeld e Dick Cheney, secretário de Defesa e vice-presidente, respectivamente, parecem ainda mais o estilo cowboy. Rumsfeld vem da extrema direita. É intimamente ligado ao Centro para Política de Segurança, um pequeno grupo fundado por Frank Gaffneey, ex-oficial do Pentágono da Era Reagan que faz lobby por uma política armamentista, como o sistema de mísseis de defesa.Depois da eleição de Jimmy Carter em 1976, Rumsfeld passou pelo sector privado, onde enriqueceu. Tornou-se um CEO (chief executive officer) de sucesso em alta tecnologia e companhias farmacêuticas. O vice-presidente Dick Cheney também enriqueceu quando no sector privado. Hoje é um milionário e influente homem do petróleo do Texas, tal como a família Bush. Foi secretário de Defesa de Bush-pai e designado vice-presidente das audiências no caso Irão-Contras. O homem é belicoso quando não se trata da própria pele. ¿Eu tinha outras prioridades, nos anos 60, do que o serviço militar¿; ¿Polarização sempre traz resultados benéficos¿; ¿Desnuclearização não é uma boa ideia¿.A linha ténue entre interesses privados e públicos é a marca de muitos na turma de Bush, principalmente nos sectores do petróleo e armas. Como secretário de Defesa de Bush-pai, Cheney redireccionou milhões de dólares em negócios governamentais para empresas privadas contratadas. Uma das que mais lucraram foi a Texas-based Brown & Root Services, especializada em logística militar. Depois da vitória de Bill Clinton, Cheney teve que deixar o governo. Mas não ficou muito tempo parado. Em 1995 tornou-se CEO da Halliburton Company, uma das maiores empresas de serviços em petróleo, proprietária da mesma Brown & Root Services. No meio as guerras, a companhia continuou e continua a fazer alguns dos mais lucrativos contratos com o Pentágono. Cheney tem vindo a ser acusado de usar contactos no governo para enriquecer. ¿Terão que questionar os interesses de Cheney, se a privatização tem realmente beneficiado o Departamento de Defesa ou as companhias privadas contratadas, como a Brown e Root¿, disse Tom Smith, director da ONG( sobre as ONGs falaremos noutro ¿POST¿) Public Citizen, responsável na luta pela defesa do consumidor nos States. Na altura dos preparativos para a invasão, a revista do New York Times perguntou para o actor e activista ambiental Robert Redford: ¿Se Dick Cheney fosse um animal, qual seria?¿ Resposta: ¿Coiote¿. Desde que voltou, Cheney fez da luta pela protecção ao meio ambiente e da ecologia coisas completamente absurdas (diz-se que aquela de cortar as árvores também lhe pertence). Cheney não está sozinho. Antes de assumir o posto de conselheira de Segurança Nacional, Condoleezza Rice foi directora por dez anos da Chevron Corporation, outra gigante do petróleo. E a ligação entre os dois... Uma dica: Cheney (diz-se) negociou o oleoduto para o transporte de petróleo bruto do mar Cáspio em nome da Chevron. O projecto estende-se do oeste do Kasaquistão ao mar Negro. E, agora, portas arrombadas, quem sabe se até ao Afeganistão.Se conseguirem resolver o imbróglio do Iraque, rices, dickes e bushes voltam o olhar para as outras reservas de petróleo do planeta... e elas estão logo ali ao lado. *Sérgio Kalili é jornalista, correspondente nos EUA de várias revistas brasileiras.



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Sábado, Dezembro 27, 2003


No balanço do 2003 e conforme o "Livro de Estilo" já anunciado, damos espaço também aos amigos e por quem temos estima. Deste modo, mais um texto do Hugo Fernandez (ele não me confirmou, creio que publicado no último "Le Monde Diplomatique", aqui vai:


O JUSTICEIRO SOLITÁRIO


No passado Dia de Acção de Graças, a tradicional e mais importante festa da família nos E.U.A, George W. Bush reiterou no aeroporto da capital iraquiana ¿ de onde, aliás, nunca saiu ¿ a sua obsessão ¿messiânica¿ e a vocação imperialista do seu país. Jantando com o administrador civil americano Paul Bremer e com mais de 600 soldados declarou, no habitual esquematismo e maniqueísmo da sua retórica, ¿Vocês estão a derrotar os terroristas aqui no Iraque para não termos de os defrontar no nosso país¿(1) , acrescentando ¿Não vamos retirar-nos perante um grupo de bandidos e assassinos.¿ Estava mais uma vez demonstrado aquilo que muitos observadores e a grande maioria da opinião pública internacional de há muito já sabiam. Por um lado, o irreprimível desejo dos americanos de que o mundo não seja mais do que o seu ¿quintal¿. Uma espécie de ¿reserva de caça¿ onde estes, ao arrepio de qualquer princípio de legalidade internacional ou de mera decência civilizacional, poderão atacar, destruir e matar quem, onde e quando muito bem entenderem. Apenas um pequeno número de ¿cães de fila¿ ¿ a que dão o pomposo nome de ¿forças da coligação¿ ¿ tem direito a acompanhá-los nesta grotesca ¿caçada¿ que, como se viu no caso da invasão do Iraque, não precisa sequer de ter qualquer justificação minimamente plausível. Por outro lado, o mito do justiceiro solitário, que contra tudo e contra todos percorre as imensidões, já não do Oeste, mas do mundo, em busca dos bandidos ou tão só de todos aqueles que possam opor-se aos seus desígnios e perturbar a sua caminhada. O mito do ¿ lonesome cowboy¿, do herói solitário e, por vezes incompreendido, dos velhos western. Esta visão do mundo tem importantes consequências.


A LÓGICA INDIVIDUALISTA


Trata-se, ao fim e ao cabo, da reactualização da ética protestante, matricial na constituição do Novo Mundo. Como diz Carl N. Degler, em Out of Our Past, ¿Ao proclamar o sacerdócio de todos os crentes, o protestantismo fez com que a relação de cada homem com Deus fosse apenas responsabilidade sua. Mais ninguém o poderia salvar; além do mais, ninguém o deveria tentar.¿, para concluir, ¿Mais preocupado com a sua salvação do que com questões mundanas, o puritano tornou-se, devido à salvação da sua alma imortal, um terrível individualista.¿(2) O próprio mito da viagem, estreitamente associado ao da expansão para o Oeste e à ideia de fronteira, não será mais que a expressão de uma busca interior com vista à regeneração moral, uma ¿demanda do eu¿. O desenvolvimento do capitalismo e da ideologia liberal ¿ que Georges Burdeau designa por ¿l¿absolutisme de l¿individu¿(3) ¿ reforçaram enormemente esta tendência. Desta postura decorrem múltiplas consequências. A fulanização das situações e a individuação dos acontecimentos, impedem qualquer perspectiva de análise da realidade minimamente consistente. Será impossível compreender, por exemplo, a dimensão da resistência iraquiana ao invasor americano, a atitude generalizada de indignação e revolta perante a ocupação do país, expressa de forma lapidar aos enviados especiais da revista Visão, Henrique Botequilha e António Xavier, por um combatente anónimo: ¿Se pudermos matar um americano, matamos. (...) Mas não podemos concordar com a sua permanência no nosso solo. Ficando, morrem. E morrerão todos, até ao último homem.¿(4) Tal como será impossível entender porque razão esse iraquiano diz convictamente que ¿Esta resistência nada tem a ver com Saddam.¿, para acrescentar ¿Só queremos os americanos fora daqui.¿ Este sentimento é de tal forma generalizado que a particular perigosidade do ¿triângulo sunita¿, à volta de Bagdad ameaça deixar de fazer muito sentido. A resistência estende-se de Norte a Sul do país, verificando-se, a cada novo ataque às forças americanas, um júbilo espontâneo da população local. Por isso, não deixa de ser patético e ao mesmo tempo trágico, a incessante busca do ¿mau da fita¿, do vilão, culpado de todas as contrariedades e desgraças, como se estivessemos a assistir ao enredo de uma qualquer produção de Hollywood. Ultimamente esse papel parece estar a ser preenchido pelo general e ex-vice-presidente iraquiano Ezzat Ibrahim al-Douri, depois de várias cartas do baralho americano da morte já terem sido capturados ou eliminados. Antes tinham sido outros. A começar pelo próprio Saddam Hussein ou por Osama bin Laden, considerados os ¿inimigos públicos nº1¿. O comando militar americano para o Médio Oriente criou mesmo uma força de elite, a Task Force 121 ¿ cujas operações se desenrolam a partir do Pentágono, debaixo do mais absoluto secretismo ¿ destinadas exclusivamente à captura ou aniquilamento destes e de outros dirigentes procurados pelos E.U.A. Na opinião várias vezes manifestada pelo presidente Bush e pela sua Administração, este é um ¿objectivo-chave¿ a alcançar. Mas, se a memória não for curta, verifica-se que a individuação das responsabilidades dos acontecimentos e a demonização dos alegados responsáveis, já foi atribuída noutras épocas a outros protagonistas. Quem não se lembra do que se passou com Khomeini, Milosevic ou com o general Noriega no Panamá. Ou do célebre senhor da guerra somali, Mohammed Farrah Aidid, cuja captura no início dos anos 90, à boa maneira do Oeste, esteve sujeita a uma recompensa de um milhão de dólares. Já para não falar dos ódios de estimação atribuídos a figuras como a do dirigente líbio Muhammar Khadafi, que viu a sua residência bombardeada pelos americanos em 1986, ou de Fidel Castro, vítima de inúmeras tentativas de assassinato. Os exemplos poderiam multiplicar-se quase indefinidamente.


A IMPOSSIBILIDADE DA ANÁLISE


Decorre duma lógica restrita de explicação baseada no papel do dirigente ou do herói, que pouco pode, de facto, entender-se do que se passa. Por isso, para além da mera propaganda, as afirmações do presidente norte-americano George W. Bush, parecem demonstrar uma enorme ignorância. Numa das suas habituais alocuções radiofónicas semanais, nos inícios de Novembro, Bush afirmou que ¿Os terroristas e baasistas leais ao antigo regime vão fracassar, porque a América e os aliados têm uma estratégia, e essa estratégia está a resultar.¿ (sublinhados nossos). Como se sabe, o mês de Novembro foi, precisamente, um dos mais violentos e mortíferos para as forças norte-americanas no Iraque. Recorde-se, a título exemplificativo, o derrube de um helicóptero norte-americano Chinook por um míssil terra-ar SA-7 ¿Strela¿ de fabrico soviético, que provocou a morte a 17 soldados e ferimentos noutros 20, num dos episódios mais sangrentos desta guerra. E, mais uma vez, os habitantes da localidade iraquiana de Albu-Issa, onde o helicóptero foi abatido, manifestaram o seu enorme regozijo: ¿É um dia de festa¿ ¿ repetiam incessantemente, enquanto exibiam com orgulho os pedaços calcinados do aparelho americano abatido ¿ ¿Se um soldado americano morre nós ficamos contentes, por isso imagine como nos sentimos hoje¿ disse Hadi, um popular entre outros que foi ouvido por um repórter da AFP que visitou o local(5) . Ultimamente e perante a divulgação de relatórios da CIA que dão conta de uma crescente adesão da população iraquiana à resistência contra a ocupação estrangeira, o chefe do Comando Central americano no Iraque, John Abizaid esclareceu que, ao contrário de números que apontavam para cerca de 50.000 iraquianos envolvidos directamente em acções contra as forças americanas, estes não seriam, afinal, mais que 5 mil! Reduz-se a resistência generalizada à dimensão de um ¿bando¿. No entanto, constata-se que o ambiente é profundamente hostil. Para os iraquianos os inimigos são, sem dúvida, as forças de ocupação estrangeiras. Reflexo disso é a interdição por parte das autoridades dos E.U.A, da recolha de quaisquer imagens de baixas ou de transporte de restos mortais de soldados americanos, tendo sido já por várias vezes denunciadas as enormes pressões da Casa Branca sobre os media para que não explorem esse assunto. O paradigma individualista, tão enraizado no ethos americano teve mesmo, na nossa opinião, um efeito dissolvente da riqueza multicultural que esteve na origem dos E.U.A. O fervilhante cadinho cultural das origens transformou-se, com o correr dos tempos, numa homogeneização de valores e de costumes e, por força da concorrência desenfreada e do fundamentalismo individualista, aniquilou qualquer referente comunitário ou sentimento de solidariedade, configurando uma autêntica situação de anomia durkheimiana. Mais; a própria ideia do outro, do diferente, é sempre considerada como uma ameaça. A agressividade desta atitude está bem atestada no racismo, discriminação, xenofobia e endémica violência da sociedade americana, que tem como uma das mais recentes expressões em termos das relações internacionais, a obscena ideia da ¿guerra preventiva¿. A este propósito, numa obra escrita nos inícios do século XX, O Papel do Indivíduo na História, o pensador russo George Plekhanov, dissertou precisamente sobre as potencialidades e limites da iniciativa dos ¿grandes homens¿ no evoluir dos acontecimentos. A sua conclusão foi esta: ¿Graças às particularidades da sua inteligência e do seu carácter, as personalidades influentes podem fazer variar o aspecto individual dos acontecimentos e algumas das suas consequências particulares, mas não podem fazer variar a sua orientação geral, que é determinada por outras forças.¿(6) De facto, para este autor, as condições históricas gerais são sempre mais determinantes que o poder das personalidades, por mais fortes e influentes que sejam. A influência individual ficará, assim, anulada? Certamente que não. Só que a possibilidade e dimensão desta influência é determinada pela organização da sociedade e pela relação de forças aí existente. O papel do indivíduo e a importância da sua acção é, portanto, redefinido. Como explica Plekhanov ¿Um homem não é grande porque as suas particularidades individuais imprimem uma fisionomia individual aos grandes acontecimentos históricos, mas porque está dotado de particularidades que tornam o indivíduo mais capaz de servir as grandes necessidades sociais da sua época¿(7) Diríamos, por outras palavras, que traduz, com propriedade, a expressão do seu tempo. E, ao contrário do que possa parecer, este tempo está cada vez mais contra o poder de Washington.


(1)Público, 28 de Novembro de 2003, p. 16.


(2)Citado em Mário Avelar, América, Pátria de Heróis, Lisboa, Colibri, 1994, p. 15. (3)Georges Burdeau, Le Libéralisme, Paris, Seuil, 1979, p.90.


(4)Visão, 27 de Novembro de 2003, pp. 76-79.


(5)Publico, 4 de Novembro de 2003, p. 12.


(6)George Plekhanov, O Papel do Indivíduo na História, Lisboa, Antídoto, 1977, p. 65, (sublinhados no original).


(7)Idem, p. 81-2.



publicado por albardeiro às 19:37
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Quase no fim de Dezembro...


Depois de um breve interregno alentejanando, voltámos para um encerramento escriturado deste breve ano que suspira para entrar no baú da memória e que deixa (mesmo no plano pessoal), umas vezes, ¿suculentas¿, outras vezes, ¿amargas¿ memórias. A História não perdoa e encarregar-se-à de tratar-lhe da saúde... ao 2003. Ler César Benjamin* e logo de seguida ver a entrevista (versão portuguesa dos 60 minutos) a Donald Rumsfeld, digamos que é melhor que xarope de poejos. (Re)Começo por lavrar o meu desabafo contra aquilo que são os causadores de retrocessos civilizacionais... Outro texto, com chancela de CAROS AMIGOS, ou seja: - O grupo fundamentalista que governa os Estados Unidos desde o golpe de Estado que levou George W. Bush ao poder lançou-se ao longo deste ano num segundo golpe de Estado, mais abrangente, desta vez dirigido contra o sistema jurídico e político internacional. A sua doutrina, expressa no chamado Project for the New American Century, fala em implantar uma "dominação de espectro amplo", baseada principalmente na consolidação de uma esmagadora superioridade militar e justificada moralmente pela necessidade de expandir para todo o mundo os valores norte-americanos, identificados (imagine-se) com o bem. De Bíblia em punho, Bush já discursou sobre o "Deus verdadeiro" antes de assinar a sua última declaração de guerra.Em três anos de poder, agindo sempre de forma unilateral, esse grupo atentou contra todos os fundamentos, internos e externos, da democracia e da civilização: aboliu direitos civis dentro dos Estados Unidos; boicotou o Protocolo de Kioto sobre o clima; retirou-se do Tratado de Mísseis Balísticos; impediu o avanço das negociações para a Convenção contra Armas Biológicas; recusou-se a submeter os seus soldados à jurisdição do Tribunal Penal Internacional, criado para julgar crimes de guerra; não assinou o acordo mundial para o ¿desaparecimento¿ das minas terrestres; incrementou a tensão militar entre as duas Coreias e entre a China e a Formosa; instalou, pela primeira vez, bases militares na América do Sul; apoiou uma política genocida na Palestina; ameaçou intervir em pelo menos meia dúzia de países do chamado "Eixo do Mal"; humilhou a Organização das Nações Unidas.Na esfera militar, os dados são impressionantes: os gastos dos Estados Unidos com armamentos superam hoje, com larga vantagem, a soma dos gastos realizada pelos outros catorze países que integram a lista dos quinze mais bem armados do mundo. O sentido de tal acumulação de poder é constituir uma nova ordem internacional, cujos contornos estão claros. Em vez de um mundo regido por regras e instituições, por exemplo, teremos aquilo que Donald Rumsfeld, secretário de Defesa, chamou de "coligações de vontade", ou seja, agrupamentos provisórios, criados para fins específicos. A invasão do Iraque tem sido apresentada como uma espécie de projecto piloto dessa nova postura.Creio que a profundidade da mudança em curso ainda não foi captada. Em última análise, ela remete-nos de volta ao mundo pré-moderno, àquela pré-modernidade high tech que Hollywood antecipou em muitos filmes, de gosto duvidoso, feitos nos últimos anos (o actual governador da Califórnia diz tudo...).A constituição dos Estados nacionais modernos - e, depois, a constituição do sistema interestatal - foi um fenómeno histórico centrado inicialmente na Europa e decorrente da imperiosa necessidade de pôr fim às guerras religiosas que ensanguentaram o continente durante mais de cem anos. O maior teórico dessa transição foi Hobbes: para sair do estado de natureza, caracterizado pela guerra de todos contra todos, e inaugurar o estado civil é necessário instituir um poder - o Leviatã - que, em vez de tentar impor um princípio moral universalmente válido, legitima-se, única e exclusivamente, pela sua capacidade de garantir a paz, estabelecendo regras mínimas de convivência entre pessoas e grupos.Por isso, o advento da modernidade ocidental foi marcado pela separação dos eixos bem/mal e paz/guerra, o que correspondeu a uma separação entre moral (remetida à esfera privada) e política (submetida à razão de Estado). Nasceu assim o Estado moderno - cuja primeira forma foi a monarquia absoluta -, que passou a concentrar em si o monopólio da violência legítima dentro de determinado território. Junto com ele, nasceu o conceito de soberania política. A partir de então, no espaço europeu abrangido por essa transformação, a invocação de teologias e leis morais deixou de ser um meio legítimo para estabelecer uma ordem política, dado o risco de reabrir a qualquer momento, com aquela invocação, a guerra de todos contra todos. Vattel estendeu o mesmo princípio às relações interestatais, fundando a possibilidade de instaurar a paz com base em regras internacionais de natureza também essencialmente política. Essa ideia ganhou forma duradoura na elaboração do conceito de equilíbrio de poder, amplamente predominante, em diferentes arranjos, desde o Tratado de Viena, de 1815, até ao fim da União Soviética, em 1991.Ao misturar novamente os eixos bem/mal e paz/guerra, e ao romper o princípio do equilíbrio de poder, o que o grupo de Bush contesta, em última análise, são os dois pilares fundadores da modernidade política ocidental, ou seja, querem negar a História. Pode parecer estranho que esse movimento parta de um Estado republicano e democrático. Com efeito, o projecto de paz perpétua, de Kant, formulado no século XVIII, pressupunha que todos os Estados nacionais assumissem justamente a forma republicana de governo, por ela ser considerada menos propensa a decisões arbitrárias: "Se o consentimento dos cidadãos tiver de ser solicitado para decidir se a guerra deve ser travada ou não, nada mais natural que eles reflictam longamente, antes de iniciar um jogo tão perigoso, pois se decidirem promovê-la recairão sobre eles mesmos as calamidades da guerra". A mesma ideia aparecera em Montesquieu. No século XIX, no entanto avisado por alguns períodos da Revolução Francesa, Tocqueville já não era tão optimista, afirmando profeticamente que o individualismo e o confinamento das pessoas na esfera privada preparariam as condições para a emergência de um novo tipo de despotismo, que chamou de "despotismo democrático": "Essa espécie de servidão, regulada, doce e pacífica, poderá conjugar-se mais facilmente do que se imagina com algumas das formas exteriores da liberdade, e não será impossível estabelecê-la sem que seja necessário retirar a soberania do povo".Os tempos actuais dão mais razão a Tocqueville que a Kant. Embora, pelo seu pragmatismo, a sociedade norte-americana tenha desenvolvido excepcionalmente a técnica, os chamados "Estados Unidos profundos" - de onde vem toda a equipa de Bush - nunca viveram a experiência do iluminismo, nem incorporaram plenamente o conceito de razão. A sua origem, ao contrário, está em grupos religiosos fechados, messiânicos e dogmáticos que agora fornecem o discurso ideológico legitimador da política desejada pelos grandes monopólios capitalistas em crise.Os dois movimentos que articulam esse discurso são complementares, pois a tarefa anunciada de levar os valores norte-americanos a sociedades não ocidentais, sendo a-histórica, exige a construção de um superpoder capaz de agir de fora para dentro das sociedades a serem "ocidentalizadas". Criar esse superpoder é romper o equilíbrio de poder. Estamos diante de um novo Leviatã, dessa vez não hobbesiano ou até anti-hobbesiano. Pois ele não se constitui para impor a paz, mas para fazer a guerra. Daí o paralelo possível, sentido intuitivamente pelas pessoas, com a experiência nazi.A existência de um poder desse tipo é uma contradição em termos. Ao buscar para si uma legitimação moral - não importa se fundada numa religião, costumes ou raça -, ele recusa a política. Ao fazê-lo, recria as condições da guerra de todos contra todos. Com uma agravante: ao contrário dos impérios que desfrutaram de supremacia em outros tempos históricos, a única superioridade que os Estados Unidos podem reivindicar para si, com veracidade, é a superioridade militar. Em todas as outras esferas - económica, política, cultural ou moral, por exemplo -, essa superioridade pode ser questionada.Estamos diante de um salto no escuro em direcção à pré-modernidade, que pode ser vista também na abolição, pelos mesmos Estados Unidos, de um exército de cidadãos e na recriação de um exército de mercenários profissionais. Agora, porém, com armas nucleares. Só uma certeza podemos ter: o Mundo está mais perigoso e o concerto entre as nações mais problemático. A espantosa resistência do povo iraquiano aos ocupantes, neste momento, já é um sinal de que a força está longe de resolver os problemas e de iluminar a esperança. Esperemos que o cogumelo atómico não escureça tudo, de vez (veja-se as verbas que foram disponibilizadas para a nova geração de armas nucleares).No próximo ¿POST¿ falaremos mais em pormenor da constituição da equipa que quer conquistar o Mundo. *César Benjamin é autor de A Opção Brasileira (Contraponto Editora, 1998, 9ª edição) e integra a coordenação nacional no Brasil do Movimento Consulta Popular.



publicado por albardeiro às 19:33
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(...) Coisas!

Sábado, Dezembro 20, 2003


Como já tinha alertado, noutra altura, sobre a possibilidade dos amigos ajudarem a "construir" este "BLOG", neste momento, dou a conhecer o excelente artigo do meu amigo Hugo Fernandez, publicado no Diário do Alentejo, sobre os "filhos da cunha" ou seja, a aleivosia dos nossos governantes que juram sempre pela sua HONRA. O melhor é lerem:


O FACTOR C


Se há convicção generalizada, é a de que o poder corrompe. E, como disse Lord Acton, ¿o poder absoluto corrompe absolutamente¿. Apesar de tudo, pensamos que se trata de um raciocínio precipitado. Há muitas autoridades, dirigentes ou simples cidadãos que se dedicam, com esforço e abnegação, à causa pública. Aliás, a facilidade com que se condena a totalidade da ¿classe política¿ e se denigre a própria acção política é uma atitude que, para além de ser arbitrária e injusta, é manifestamente perigosa. Quantas tiranias se instalaram ao longo da História, a coberto de ideias ¿messiânicas¿ e de projectos falsamente ¿regeneradores¿. No entanto, também não podemos negar que são cada vez mais frequentes os fenómenos de corrupção ¿ na pior das hipóteses ¿ e de compadrio ¿ na melhor das hipóteses. É o célebre ¿factor C¿ (de cunha) a funcionar. Quando este ocorre, toda a filosofia meritocrática que supostamente norteia a nossa vida colectiva ¿ proclamada sem cessar pela ideologia dominante ¿ se desmorona, deixando a descoberto a verdadeira natureza da sociedade em que vivemos. Ficam patentes as desigualdades de condição e de oportunidades, remetendo para o domínio dos ¿contos de encantar¿ o mito do self made man ou, dito de outro modo, do miserável que se torna milionário. Está bem de ver que o compadrio só tem sentido no seio da desigualdade. Quanto mais extremada esta for, maiores as possibilidades de actuação do ¿factor C¿. Sendo o poder, cada vez mais, uma relação de soma zero, em que o aumento da influência de uns poucos corresponde ao total despojamento de força de todos os outros, também é natural que quanto mais poder tenham determinadas pessoas, maior apetência e competência adquiram para o efeito. Em última instância, é ao nível governamental que as coisas mais graves se podem passar. Aqui, no centro das decisões, impera um sem-número de tentações, a que só a verticalidade de carácter e a honestidade de propósitos podem obviar. Por isso, a par da competência, a probidade é a principal exigência que é feita aos mais altos magistrados da Nação. Daí decorre a confiança que os cidadãos neles depositam quando, pelo voto, os escolhem. Por isso também, a quebra desta confiança assume uma enorme gravidade. Antes de mais do ponto de vista político. A censura às atitudes reprováveis e ao abuso de poder merecerá, necessariamente, a perda de confiança e a não reeleição. Mas a descoberta do compadrio, deve também obrigar à assunção de responsabilidades civis e, eventualmente criminais, sob pena de total descredibilização de todo o sistema. Porque, quando se cometem manifestas ilegalidades, tem que haver sanções. Tal é, de resto, o que se passa com todos os outros cidadãos. Ainda para mais, quando estas ilegalidades são cometidas invocando o cumprimento escrupuloso da lei. Nestas circunstâncias, a mentira é ainda mais intolerável. A justeza de actos e intenções impõe-se por si própria. Não precisa de ser justificada, nem proclamada em voz alta. Quando se pretenda, por esta via, dissimular o cinismo e a hipocrisia, não se iludam. Sejam governantes ou poderosos, tratam-se, afinal, de vulgares canalhas.



publicado por albardeiro às 19:30
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Num dia de Dezembro de 2003


(ver os arquivos de WWW.albardeiro.blogger.com.br)


Perante a catadupa de acontecimentos que decorreram depois do meu último ¿post¿ só me resta continuar na mesma onda. Desculpem lá... mas não á volta a dar... por enquanto! A não ser se adoptarmos a via proposta por Samir Amim* (sim esse mesmo): Contra o projecto americano de "controle do planeta", é legítimo que os povos se rearmem.Contudo, podemos sempre discorrer e apresentar textos que ele não desdenharia escrever(?!) Cá vai: Desde os anos 80, quando é anunciado o colapso do sistema soviético, desenha-se uma opção pela hegemonia que conquista a classe dirigente dos Estados Unidos. Levados pela vertigem do seu poder armado, desde então sem concorrente, os Estados Unidos decidem afirmar a sua dominação, pelo desencadeamento de uma estratégia estritamente militar de "controle do planeta".A estratégia política de acompanhamento do projecto prepara os seus pretextos, seja quando se trate do terrorismo, da luta contra o narcotráfico ou da acusação de produção de armas de destruição em massa.A "guerra preventiva", formulada desde então como um "direito" que Washington invoca para si, faz abolir logo de início qualquer direito internacional. A Carta das Nações Unidas proíbe o recurso à guerra, salvo no caso de legítima defesa; e submete a condições severas a sua eventual intervenção militar, que deve ser comedida e provisória. Todos os juristas sabem que as guerras empreendidas desde 1990 são perfeitamente ilegítimas e portanto que, em princípio, os que assumiram a responsabilidade de desencadeá-las são criminosos de guerra. As Nações Unidas já são tratadas pelos Estados Unidos, mas com a cumplicidade de outros países, como foi no passado tratada a Liga das Nações pelos Estados fascistas.A abolição do direito dos povos, já consumada, substitui o princípio da igualdade pelo da distinção entre um Herrenvolk* (o povo dos Estados Unidos e acessoriamente o de Israel) que tem o direito de conquistar o "espaço vital" que julga necessário, e os outros povos, cuja própria existência não é nem mesmo tolerável, a não ser que não represente uma "ameaça" ao desenvolvimento de projectos dos autoproclamados "senhores do mundo". Tornamo-nos todos, aos olhos do establishment de Washington, uns "peles-vermelhas", quer dizer, povos que não têm direito à existência a não ser na medida em que não prejudiquem a expansão do capital transnacional americano.Estado da economiaQuais são esses interesses "nacionais" que a classe dirigente dos Estados Unidos se reserva o direito de invocar como melhor lhe pareça? Na verdade, essa classe possui um único objectivo - "fazer dinheiro" -, tendo o Estado americano colocado-se aberta e prioritariamente ao serviço do segmento dominante do capital constituído pelas transnacionais dos Estados Unidos.Esse projecto é imperialista no sentido mais brutal, pois não se trata de gerenciar o conjunto das sociedades do planeta para integrá-las num sistema capitalista coerente, mas somente de saquear os seus recursos. A redução do pensamento social aos postulados de base da economia vulgar, reforçada pela disposição dos meios militares que se conhecem, é responsável por essa derivação bárbara que o sistema carrega no seu interior e que o desembaraça de todo o sistema de valores humanos, substituído pela submissão às pretensas leis do mercado. Pela história da sua formação, o capitalismo americano prestava-se a esse reducionismo de modo ainda melhor do que o das sociedades europeias. Pois o Estado americano e a sua visão política foram formados para servir a economia e nada mais, abolindo por isso mesmo a relação contraditória e dialéctica entre a economia e a política. O genocídio dos índios, a escravidão dos negros, a sucessão de ondas de migrações substituindo a maturação da consciência de classe pelo confronto de grupos que partilhariam pretensas identidades comunitárias (manipuladas pela classe dirigente) produziram uma gestão política da sociedade por um partido único do capital, em que os dois segmentos partilham as mesmas visões estratégicas globais, partilham retóricas adequadas para se dirigir a cada um dos "eleitorados" da pequena metade da sociedade que crê no sistema o bastante para se dar ao trabalho de ir votar. Privada da tradição pela qual os partidos operários social-democratas e comunistas marcaram a formação da cultura política europeia moderna, a sociedade americana não dispôs de instrumentos ideológicos que lhe permitissem resistir à ditadura do capital.Se esse projecto se deve desenvolver durante ainda um certo tempo, ele não gerará mais do que um caos crescente, exigindo uma gerência cada vez mais brutal a cada golpe, sem visão estratégica a longo prazo. No limite, Washington não buscará mais reforçar alianças verdadeiras, o que imporia fazer concessões. Governos fantoches, como o de Karzai no Afeganistão, cumprem melhor a tarefa enquanto o delírio da potência militar levar à crença da "invencibilidade" dos Estados Unidos. Hitler pensava assim.Vantagem de perdedorA opinião geral mais corrente é que o poder militar dos Estados Unidos constituiria apenas a ponta do iceberg, prolongando uma superioridade do país em todos os domínios, nomeadamente os económicos, e ainda os políticos e culturais. A submissão à hegemonia que ele preconiza seria, portanto, incontornável.O exame das realidades económicas, porém, não dá apoio a tal opinião. O sistema produtivo dos Estados Unidos está longe de ser "o mais eficiente do mundo". Ao contrário, quase nenhum dos seus segmentos teria a certeza de vencer os seus concorrentes num mercado verdadeiramente aberto como o imaginado pelos economistas liberais (veja-se o caso mais notório ¿ o aço). É prova disso o déficit comercial do país que se agrava de ano para ano, tendo passado de 100 biliões de dólares em 1989 a 450 biliões em 2000. Além disso, tal déficit refere-se a praticamente todos os segmentos do sistema produtivo. Mesmo o excedente em que beneficiavam os Estados Unidos no domínio dos bens de alta tecnologia, que era de 35 biliões em 1990, desde então deu lugar a um déficit. A concorrência entre o Ariane e os foguetes da Nasa, o Airbus (actualmente vende mais e tem maior capacidade de entrega) e o Boeing mostra a vulnerabilidade da vantagem americana. Diante da Europa e do Japão para os produtos de alta tecnologia, da China, da Coreia e dos outros países industrializados da Ásia e da América Latina para os bens manufacturados triviais, diante da Europa e do Cone Sul da América Latina para a agricultura, os Estados Unidos não triunfariam, provavelmente, sem o recurso dos meios "extra-económicos" que violam os princípios do liberalismo impostos aos seus concorrentes!A economia americana vive como parasita em detrimento dos seus parceiros no sistema mundial. "Os Estados Unidos dependem, para 10 por cento do seu consumo industrial, de bens cuja importação não é coberta pelas exportações de produtos nacionais" (E. Todd., Depois do Império, página 80).O mundo produz, os Estados Unidos consomem. A "vantagem" dos Estados Unidos é a vantagem de um predador cujo déficit é coberto pelo aporte de outros, consentido ou forçado. Os meios usados por Washington para compensar as suas deficiência são de naturezas diversas: violações unilaterais repetidas do liberalismo, exportação de armamentos em grande parte impostos a aliados subalternos, busca de rendas petrolíferas suplementares (que pressupõe a imposição da ordem entre os produtores, motivo real das guerras na Ásia Central e no Iraque). Resta dizer que o essencial do déficit americano é coberto pelos aportes em capitais provenientes da Europa e do Japão, aos quais se deve acrescentar a punção exercida em nome do serviço da dívida imposta à quase totalidade da periferia do sistema mundial.A solidariedade dos segmentos dominantes do capital transnacional de todos os parceiros desse trio é real, e exprime-se pela sua adesão ao neoliberalismo globalizado. Os Estados Unidos são vistos nessa perspectiva como os defensores (militares, se necessário) desses "interesses comuns". Washington não busca "partilhar com equidade" os lucros da sua liderança. Os Estados Unidos empenham-se, ao contrário, em tornar vassalos os seus aliados, e dentro desse espírito não estão preparados para deixar aos seus aliados subalternos do trio mais do que concessões menores. Esse conflito de interesses estará destinado a agudizar-se a ponto de desencadear uma ruptura na Aliança Atlântica? Pelo que tem sucedido ao longo deste ano, não é impossível...O conflito promissor situa-se num outro terreno. O das culturas políticas. Na Europa, uma alternativa de esquerda mantém-se sempre possível. Essa alternativa imporia simultaneamente uma ruptura tanto com o neoliberalismo quanto com o alinhamento às estratégias políticas dos Estados Unidos. O excedente de capitais que a Europa se contenta até agora em "colocar" nos Estados Unidos poderia então ser alocado a um relançamento económico e social, sem o que esse relançamento continuará impossível. Mas, assim que a Europa escolhesse, por esse meio, dar prioridade ao seu desenvolvimento económico e social, a saúde artificial da economia dos Estados Unidos entraria em colapso e a classe dirigente americana se veria em confronto com os seus próprios problemas económicos e sociais. Eis por que "a Europa será de esquerda ou não será nada". Mas uma coisa também é certa, o perigo de uma implosão americana terá mais consequências que as suas várias explosões.As causas que estão na origem do enfraquecimento do sistema produtivo dos Estados Unidos são complexas. Mas são estruturais. A mediocridade dos sistemas de ensino geral e da formação, produto de um preconceito tenaz que favorece sistematicamente o "privado" em detrimento do serviço público, é uma das razões mais importantes da crise profunda que a sociedade dos Estados Unidos atravessa.A opção militarista dos Estados Unidos ameaça todos os povos. É proveniente da mesma lógica que foi no passado a lógica de Adolf Hitler: modificar pela violência militar as relações económicas e sociais em favor do Herrenvolk do momento. Essa opção, ao impor-se à frente do cenário internacional, sobredetermina todas as conjunturas políticas, pois a efectivação do desencadeamento desse projecto fragilizaria a um ponto extremo os avanços que os povos pudessem obter através das suas lutas sociais e democráticas. Pôr em xeque o projecto militarista dos Estados Unidos torna-se então a tarefa primordial, a responsabilidade maior, para todos. Sem dúvida, um certo número de governos do Terceiro Mundo é odioso e, provavelmente, só subsistem porque isso é bom para os interesses americanos. Mas o caminho para a sua necessária democratização não passa, certamente, pela sua substituição por regimes fantoches vindos nos blindados do invasor, abandonando os recursos do seu país à pilhagem das transnacionais americanas.O combate para pôr em xeque o projecto dos Estados Unidos é, com certeza, multiforme. Comporta aspectos diplomáticos (defender o direito internacional), militares (por exemplo, fará sentido o rearmamento de todos os países para enfrentar as agressões projectadas por Washington - nunca esquecer que os Estados Unidos utilizaram armas nucleares quando tinham o seu monopólio e renunciaram a elas durante o tempo em que não tinham mais esse monopólio) e políticos (nomeadamente no que se refere à construção europeia e à reconstrução de uma frente dos [esquecidos ou adormecidos] não-alinhados).O combate contra o imperialismo dos Estados Unidos e a sua opção militarista é o combate de todos os povos, das suas vítimas maiores da Ásia, África e América Latina, dos povos europeus e japoneses condenados à subordinação, mas também igualmente do povo americano. Saudemos aqui a coragem de todos aqueles que, "no coração da besta", recusam a submeter-se, como os seus predecessores recusaram ceder ao macarthismo dos anos 1950. Como aqueles que ousaram resistir a Hitler, eles conquistaram todos os títulos de nobreza que a história pode conceder. A classe dominante dos Estados Unidos será capaz de voltar atrás no projecto criminoso a que aderiu? Uma pergunta que não é fácil de ser respondida. Evidentemente que algumas derrotas políticas, diplomáticas e talvez mesmo militares poderiam encorajar as minorias que, no seio do establishment dos Estados Unidos, aceitariam renunciar às aventuras militares nas quais o seu país se engajou.Se tivessem reagido em 1935 ou 1937, os europeus teriam conseguido deter o delírio hitlerista. Reagindo somente em Setembro de 1939, eles sofreram dezenas de milhões de vítimas. Tem todo o sentido afirmar: actuemos para que, diante do desafio dos neonazistas de Washington, a resposta seja mais precoce. *Samir Amin, pensador neomarxista, é egípcio, formou-se em Paris e dirige o Fórum do Terceiro Mundo em Dacar, autor de A Acumulação à Escala Mundial



publicado por albardeiro às 19:27
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